30 de maio de 2011

Sobre os acontecimentos em Espanha


Miguel Urbano Rodrigues

As grandes mobilizações de “indignados” assumem como denúncia central a ausência de democracia autêntica. Neste início do século XXI, no contexto de uma gravíssima crise mundial de civilização, o capitalismo, em fase senil, cola o rótulo de democracia representativa a ditaduras da burguesia de fachada democrática.

Os acontecimentos da Espanha, pelo seu significado, estão a polarizar a atenção da Europa e de milhões de pessoas noutros continentes. Em Washington, Berlim, Paris e Londres, o acampamento da Puerta del Sol, inicialmente encarado como iniciativa folclórica de jovens pequeno burgueses frustrados, gera agora preocupação.

Quando o chamado Movimento M-15 alastrou a dezenas de cidades do país e nas capitais europeias centenas de pessoas se manifestaram frente às embaixadas espanholas, a indiferença evoluiu para um sentimento de temor.

Porquê?

O protesto espanhol insere-se na crise global de civilização que a humanidade enfrenta, cujas raízes arrancam da crise estrutural de um sistema de opressão: o capitalismo.

Seria um erro concluir que os jovens que criaram o Movimento «Democracia Real Ya » são revolucionários e o seu objectivo é a destruição do regime. O M-15 atraiu gente muito diferente. Alguns nem sequer rejeitam a obsoleta e corrupta monarquia bourbonica. Mas rapidamente a contestação popular excedeu as previsões. O Movimento, após a repressão do primeiro dia, foi olhado quase com benevolência pelo PP e pelo PSOE os dois grandes partidos da burguesia. Mas, ao assumir proporções torrenciais, o protesto adquiriu os contornos de uma condenação do regime na qual as massas emergiam como sujeito histórico.

Na Puerta del Sol começaram a ouvir-se brados inesperados: «No al FMI »; «No a la farsa electoral»; «PSOE y PP, la misma gente!»; «Noa las guerras de los EEUU!». Soou até a palavra «Revolução!»

Daí o medo.

Os jovens de Madrid sabem o que não querem, mas a grande maioria não tem uma ideia minimamente clara sobre o que fazer e como actuar. As reivindicações aprovadas a 20 de Maio, na Assembleia do acampamento, são moderadas, algumas ingénuas. Espontaneista, o M-15 não acampa no centro de Madrid em função de uma estratégia de Poder.

Quando aquilo principiou o que unia a multidão heterogénea de jovens pouco mais era que a recusa da caricatura de democracia. Terá sido uma surpresa para o pequeno núcleo inicial a adesão maciça de adultos, de desempregados, de reformados. Foi ainda numa atmosfera de confusão que surgiram as primeiras lideranças embrionarias, os porta-vozes do acampamento.

Jovens entrevistados por media internacionais manifestaram espanto ao tomar conhecimento da repercussão internacional da iniciativa e das concentrações de solidariedade em cidades espanholas e europeias.

DE TUNIS A MADRID

O protesto dos «indignados» de Espanha foi obviamente inspirado pelo modelo da Tunísia e do Egipto. Na época da comunicação instantânea, as redes sociais permitiram que em tempo rapidíssimo os apelos à concentração popular na Puerta del Sol fossem atendidos por milhares de jovens. A praça madrilena foi a Tahrir egípcia.

Tal como ocorrera no Norte de África, a exigência de «democracia» funcionou como motor da mobilização popular.

Mas enquanto nas rebeliões contra Ben Ali e Hosni Mubarak as massas reivindicavam liberdades, eleições livres, um parlamento tradicional, destruição de aparelhos repressivos, o fim de ditaduras ferozes e a sua substituição por regimes representativos similares aos da União Europeia, em Espanha a «democracia real ya» reclamada pelos «indignados» partia dialecticamente da recusa do figurino pelo qual se batiam os africanos.

O que para os árabes era ambição e sonho aparece hoje a muitos dos acampados da Puerta del Sol como caricatura da democracia, rosto de um regime cuja prática nega os valores e princípios que invoca, que concentra a riqueza numa ínfima minoria e promove o desemprego, amplia a desigualdade social.

Enquanto a burguesia tunisina e egípcia se solidarizava com os rebeldes que se manifestavam contra Ali e Mubarak e o imperialismo rompia com os seus aliados da véspera, a burguesia espanhola, os partidos tradicionais e os poderosos da União Europeia condenavam os «indignados» peninsulares, identificando neles arruaceiros de um novo tipo.

Merece reflexão a dualidade antagónica da posição assumida pelo imperialismo americano. Na Casa Branca, o presidente Obama compreendeu que as reivindicações dos rebeldes da Tunísia e do Egipto não colidiam com a sua estratégia para a Região e, agindo com rapidez e eficácia, estimulou e aplaudiu nesses países a instalação de Governos de transição ditos democráticos, sob a tutela de personalidades militares e civis que, com poucas excepções, tinham servido as ditaduras eliminadas. Na Líbia bombardeia Tripoli ; no Golfo pede à Arábia Saudita que afogue em sangue rebeliões incomodas como a do Bahrein, sede da V Esquadra da US Navy.

O imperialismo encara, naturalmente, com desconfiança e apreensão o alastramento do protesto inorgânico dos jovens «indignados». Obama e o Pentágono interrogam-se sobre as consequências imprevisíveis de um movimento que condena com dureza o envolvimento da Espanha nas guerras asiáticas dos EUA.

ADESÕES INTERNACIONAIS

A direita arrasou o PSOE nas eleições municipais de domingo. Os acampados da Puerta del Sol reagiram com indiferença aparente aos resultados. «Eles não nos representam», declararam porta vozes do M-15, sublinhando que na engrenagem do poder, o PSOE e o PP, embora com discursos, histórias , percursos e bases sociais diferentes, praticam no governo politicas neoliberais muito semelhantes, e politicas externas caracterizadas pela submissão às exigências dos EUA e de Bruxelas.

Significativamente, o espaço e o tempo que os media espanhóis dedicaram durante a última semana aos «indignados» diminuíram drasticamente desde sábado. O tema quase desapareceu das primeiras páginas dos grandes jornais e do programa dos canais de televisão. A vitória do PP e o avanço das Autonomias monopolizaram a atenção de políticos, analistas e jornalistas do sistema.

Oposta é a atitude assumida pela maioria dos intelectuais progressistas. Na Espanha e também na América Latina, personalidades de prestigio, em artigos e entrevistas publicados em revistas Web de informação alternativa como Resumen Latino Americano e Rebelión e outras, expressam a sua solidariedade com os jovens do M-15 e reflectem sobre o significado e as consequências da contestação.

Cito alguns exemplos expressivos.

O filósofo e escritor marxista Santiago Alba Rico, num artigo intitulado «La Qasba en Madrid» sublinhou que a Espanha «não é uma democracia». E acrescenta, realista: «Não haverá uma revolução em Espanha. Mas uma surpresa, um milagre, uma tormenta, uma consciência nas trevas, um gesto de dignidade na apatia, um acto de coragem na anuência, uma afirmação anti-publicitaria de juventude, um grito colectivo de democracia na Europa, não é já um pouco uma revolução?»

Carlos Taibo, professor da Universidade Autónoma de Madrid, esteve na Puerta del Sol levando solidariedade, e dirigindo-se aos acampados disse ao saudá-los: «Os que aqui estamos somos, obviamente, pessoas muito diferentes. Temos na cabeça projectos e ideais diferentes. Mas conseguimos, apesar disso, chegar a acordo quanto a um punhado de ideias básicas». E, parafraseando Santiago Alba Rico, afirmou: «Aquilo a que em Espanha chamam democracia, não o é!».

O escritor italiano Carlo Frabetti escreveu: «Desde o protesto dos Goya de 2003 que não se conseguira um aproveitamento tão eficaz de contestaçao interna do sistema e a sua expressão cultural do espectáculo».

Atilio Borón, um sociólogo marxista argentino de prestígio internacional, dedica aos jovens acampados um artigo entusiástico intitulado «Os indignados e a Comuna de Paris». Lembra que aquilo que a democracia de Moncloa propõe para enfrentar a «crise é o despotismo do mercado, irreconciliável com qualquer projecto democrático». E, cedendo a um impulso romântico, conclui o artigo com estas palavras: «Se persistirem (os indignados) na sua luta poderão derrotar a prepotência do capital e, eventualmente, iniciar uma nova etapa na história não só da Espanha, mas da Europa».

Angeles Maestro, a destacada dirigente de «Corriente Roja», da Espanha, mais realista, salienta que os acampamentos em dezenas de cidades espanholas «têm um conteúdo anticapitalista» e neles ondula «uma multidão de bandeiras republicanas». Enfatiza o descrédito da montagem eleitoral e afirma que «As mobilizações maciças que se iniciaram em numerosas cidades do estado espanhol a 15 de Maio e que tiveram continuidade em acampamentos, assembleias e convocatórias para novas manifestações expressam o alto nível de indignação e raiva de uma juventude que não tem qualquer esperança de chegar a ter os direitos básicos que a Constituição pomposamente proclama: direito ao trabalho, à habitação, à educação e saúde publica de qualidade, a uma pensão digna, etc.».

Quanto ao futuro do Movimento, adverte como revolucionaria experiente: «Nos processos sociais não há atalhos. Se é um facto que a faúlha da espontaneidade está sempre presente e serve para desencadear as mobilizaçoes, somente o avanço da organização é a medida da acumulação de forças, e sem acumulação de forças as lutas leva-as o vento.»

AMANHÃ INCERTO

Esperanza Aguirre, a reeleita alcaide de Madrid, não esconde a sua hostilidade aos acampados. Se dela dependesse, declarou, ordenaria à Policia que expulsasse da Puerta del Sol os acampados. A repressão inicial foi esclarecedora da sua posição. Mas carece de poderes para recorrer à força.

Qual o desfecho do protesto dos «indignados»?

Por ora é imprevisivel.

Vai persistir, transformando-se em desafio ao Poder?

Uma Assembleia, improvisada e tumultuosa como as anteriores, decidiu manter manter o acampamento até ao próximo domingo. Durante a semana os activistas irão aos bairros. Depois se verá.

Em Barcelona e noutras cidades, as concentrações de protesto também não se dissolveram, mas os próprios organizadores admitem que o número de participantes diminua nos próximos dias.

Repito: os jovens «indignados» sentem dificuldade em definir um rumo para a luta que iniciaram. A maioria talvez não tenha consciência da complexidade do desafio lançado ao Poder.

Volto a citar Angeles Maestro: «O processo de confluência múltipla em torno a um programa comum somente poderá abrir caminho se criar raízes nas lutas operárias e populares. Por outras palavras, se a construção do referente politico beber a seiva na luta de classes e demonstrar a sua utilidade para abordar um longo processo de acumulação de forças».

A consciência demonstrada pelos «indignados» de Madrid de que a «democracia representativa» é uma ficção no Estado Espanhol deve porém ser saudada como acontecimento importante no âmbito das lutas de massa europeias e não ignorada, subestimada ou mesmo criticada com sobranceria em atitudes irresponsáveis por alguns dirigentes de partidos de esquerda da União Europeia.

Não compartilho a euforia prematura de Atilio Boron, mas julgo oportuno reafirmar que a Espanha não é excepção na Europa. Não há democracia autêntica sem participação decisiva do povo. Na União Europeia um sistema mediático perverso e desinformador esconde a realidade. Os regimes existentes nos 27 diferenciam-se muito. Mas existe um denominador comum: a ausência de uma democracia autêntica. Neste início do século XXI, no contexto de uma gravíssima crise mundial de civilização, o capitalismo, em fase senil, cola o rótulo da democracia representativa a ditaduras da burguesia de fachada democrática.

Vila Nova de Gaia, 23 de Maio de 2011.

Fonte: http://www.odiario.info/?p=2082

A financeirização da burocracia sindical no Brasil


Alvaro Bianchi e Ruy Braga

Aproximam-se as eleições para o Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região. Trata-se não apenas do maior sindicato da categoria do país - e isso já bastaria para que o pleito atraísse a atenção de todo o movimento sindical brasileiro. Mas essa eleição também tem um alcance maior que deve ser levado em consideração: o de definir os rumos de uma entidade que cumpre atualmente um papel estratégico na ordem política atual.

Afinal, desde a eleição de Lula da Silva, em 2002, a relação do sindicalismo brasileiro com o aparelho de Estado modificou-se radicalmente. Nunca é demais rememorar alguns fatos. Em primeiro lugar, a administração de Lula da Silva preencheu aproximadamente metade dos cargos superiores de direção e assessoramento – cerca de 1.300 vagas, no total – com sindicalistas que passaram a controlar um orçamento anual superior a R$ 200 bilhões. Além disso, posições estratégicas relativas aos fundos de pensão das empresas estatais foram ocupadas por dirigentes sindicais. Vários destes assumiram cargos de grande prestígio em companhias estatais – como, por exemplo, a Petrobrás e Furnas Centrais Elétricas –, além de integrarem o conselho administrativo do BNDES. O governo Lula promoveu, ainda, uma reforma sindical que oficializou as centrais sindicais brasileiras, aumentando o imposto sindical e transferindo anualmente cerca de R$ 100 milhões para estas organizações.

Tudo somado, o sindicalismo brasileiro elevou-se à condição de um ator estratégico no tocante ao investimento capitalista no país. Esta função, não totalmente inédita, mas substancialmente distinta daquela encontrada no período anterior, estimulou Francisco de Oliveira a apresentar, ainda no início do primeiro governo de Lula da Silva, sua hipótese acerca do surgimento de uma "nova classe" social, baseada na articulação da camada mais elevada de administradores de fundos de previdência complementar com a elite da burocracia sindical participante dos conselhos de administração desses mesmos fundos.

Na opinião de Oliveira, a aproximação entre "técnicos e economistas doublés de banqueiros" e "trabalhadores transformados em operadores de fundos de previdência" serviria para explicar as convergências programáticas entre o PT e o PSDB e compreender, em última instância, o aparente paradoxo de um início de mandato petista que, nitidamente subssumido ao domínio do capital financeiro, conservou o essencial da política econômica estruturada pelos tucanos em torno do regime de metas de inflação, do câmbio flutuante e do superávit primário nas contas públicas.

Ao mesmo tempo em que Oliveira avançava a tese da "nova classe", apresentamos a hipótese de que o vínculo orgânico "transformista" da alta burocracia sindical com os fundos de pensão poderia não ser suficiente para gerar uma "nova classe", mas seguramente pavimentaria o caminho sem volta do "novo sindicalismo" na direção do regime de acumulação financeira globalizado. Apostávamos que essa via liquidaria completamente qualquer possibilidade de retomada da defesa, por parte desta burocracia, dos interesses históricos das classes subalternas brasileiras. Chamamos esse processo de "financeirização da burocracia sindical".

Assim como várias análises críticas do governo do Partido dos Trabalhadores, o problema da hipótese da "nova classe" era explicar como se chegou até esse ponto. Não foram poucos os analistas que acreditaram que a Carta ao Povo Brasileiro, na qual Lula da Silva garantia a segurança dos operadores financeiros, teria modificado de modo radical o curso seguido até então pelo PT e mesmo pelo seu candidato. A hipótese da "financeirização da burocracia sindical" enfrentava esse problema e localizava sua origem em uma burocracia sindical presente no partido desde seus primeiros passos no ABC paulista e que ao longo dos anos 1990 associou-se gradativamente ao capital financeiro. A trajetória do PT só surpreendeu quem não quis ver ou ouvir.

A história recente da burocracia do Sindicato dos Bancários de São Paulo é exemplar. Como muitas entidades filiadas à CUT, a dos bancários de São Paulo alinhou-se com a administração Lula da Silva e se transformou em porta-voz do governo na categoria. Em todas as situações nas quais os trabalhadores enfrentaram o governo, a diretoria dessa entidade procurou colocar-se na condição de amortecedor do conflito social, papel desempenhado pelos tradicionais pelegos sindicais. No jornal e nas revistas do Sindicato a propaganda do governo dá o tom (1). O "Sindicato cidadão" deu lugar ao "Sindicato chapa-branca".

Este não é, entretanto, um caso de simples adesismo. É possível dizer que a cúpula dos bancários de São Paulo foi o principal meio de ligação da aliança afiançada por Lula da Silva entre a burocracia sindical petista e o capital financeiro. Na verdade, como previmos, o cimento desse pacto foram os setores da burocracia sindical que se transformaram em gestores dos fundos de pensão e dos fundos salariais. O Sindicato dos Bancários de São Paulo forneceu os quadros políticos para essa operação. Enquanto os sindicalistas egressos das fileiras dos metalúrgicos do ABC ocupavam-se da política trabalhista e Luiz Marinho tomava assento no Ministério do Trabalho, os bancários de São Paulo voavam em direção ao mercado financeiro.

Esse vôo era um desejo antigo. Gilmar Carneiro, presidente do sindicato entre 1988 e 1994, declarou quando ainda era diretor do Sindicato dos Bancários que ao fim de seu mandato poderia ser diretor do Banco do Estado do Rio de Janeiro do qual havia sido funcionário. Seu sonho não foi realizado, mas logo a seguir Carneiro transformou-se em diretor de um dos braços financeiros do Sindicato, a Cooperativa de Crédito dos Bancários de São Paulo. Seu predecessor Luiz Gushiken, presidente de 1985 a 1987, foi mais longe. No começo dos anos 2000, Gushiken mantinha a empresa Gushiken & Associados, juntamente com Wanderley José de Freitas e Augusto Tadeu Ferrari. Com a vitória de Lula da Silva a companhia mudou de nome e passou a se chamar Globalprev Consultores Associados. O ex-bancário retirou-se da empresa e coincidentemente esta passou, logo a seguir, a fazer lucrativos contratos com os fundos de pensão (2). Tornou-se, assim, eminência parda dos fundos de pensão estatais, sendo decisivo para a indicação do comando do fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil (Previ), da Petrobras (Petros) e da Caixa Econômica Federal (Funcef).

O sucessor de Gushiken e Carneiro, Ricardo Berzoini, tem também sólidos laços com o sistema financeiro. Foi ele o promotor da reforma da previdência, que além de retirar direitos dos trabalhadores abriu o caminho para instituição da previdência complementar. Os fundos de pensão estatais e privados foram os grandes beneficiados por essa medida. Berzoini tem sido recompensado. Levantamento feito pelo jornal Folha de S. Paulo em 2009 constatou que 43 diretores de fundos de pensão têm vínculos com partidos políticos, a maioria deles com o PT. Desses diretores 56% fizeram doações financeiras a candidatos nas últimas quatro eleições e o então presidente nacional do PT, Ricardo Berzoini, recebeu quase um terço delas (3) .

A conversão de dirigentes sindicais em gestores financeiros tem um caso exemplar: Sérgio Rosa. Este gestor começou sua carreira como funcionário do Banco do Brasil, integrando a diretoria do Sindicato dos Bancários de São Paulo na gestão de Luiz Gushiken. Em 1999, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, Rosa assumiu um cargo de diretor da Previ, representando os funcionários do banco. Com a posse de Lula da Silva, passou à posição de presidente da Previ, comandando o maior fundo de pensão da América Latina e o 25º do mundo em patrimônio. Após o final de seu mandato assumiu o comando da Brasilprev, a empresa de previdência aberta do Banco do Brasil. Em janeiro de 2011, aos 50 anos, Rosa aderiu "programa de desligamento de executivos" do BB e se aposentou.

A financeirização da burocracia sindical é um processo que divide fundamentalmente a classe trabalhadora e enfraquece a defesa de seus interesses históricos. Na condição de gestores dos fundos de pensão, o compromisso principal deste grupo é com a liquidez e a rentabilidade de seus ativos. Muitos têm argumentado que os fundos teriam um papel importante na seleção de investimentos ecologicamente sustentáveis e geradores de empregos. Pura enganação.

Os fundos de pensão brasileiros têm atuado como uma linha estratégica do processo de fusões e aquisições de empresas no país e, consequentemente, estão financiando o processo de oligopolização econômica com efeitos sobre a intensificação dos ritmos de trabalho, o enfraquecimento do poder de negociação dos trabalhadores e o enxugamento dos setores administrativos. Isso sem mencionar sua crescente participação em projetos de infra-estrutura, como a usina de Belo Monte, uma das principais fontes de preocupação dos ambientalistas brasileiros (4) .

Tendo em vista a natureza semiperiférica de sua estrutura econômica, o Brasil apresenta importantes dificuldades relativas ao investimento de capital. A taxa de poupança privada é historicamente baixa e a solução para o investimento depende fundamentalmente do Estado. Os fundos de pensão atuam nesta linha, buscando equacionar a relativa carência de capital para investimentos. O curioso é que, no período atual, a poupança do trabalhador, administrada por burocratas sindicais oriundos do novo sindicalismo, está sendo usada para financiar o aumento da exploração do trabalho e da degradação ambiental.

Por tudo isso, a atual eleição no Sindicato dos Bancários de São Paulo tem repercussões nacionais e efeitos amplos na vida política do país. Na realidade, o que está em questão é o processo de aprofundamento da financeirização da burocracia sindical cutista e a preservação de um dos pilares de sustentação dos governos petistas. Para a oposição de esquerda não são, pois, questões de tática sindical as que devem prevalecer e sim questões estratégicas, porque esta não é simplesmente mais uma eleição sindical; trata-se de uma escolha entre projetos político-estratégicos antagônicos que têm lugar em um Sindicato.

Notas:

(1) O site do Sindicato dos Bancários de São Paulo parece ter sido desenhado para a campanha eleitoral de 2011. Nele é possível ler: "A estabilidade econômica, com crescimento médio de 3,6% da economia a cada ano desde 2002 e a criação, no mesmo período, de 10,8 milhões de novos postos de trabalho no mercado formal reforçaram o poder dos trabalhadores e deram base para a política de valorização do salário mínimo e da correção da tabela do IR, entre outros avanços importantes garantidos durante os oito anos do governo Lula".

(2) Ronaldo França. "Ação entre amigos", Veja, n. 1912, 6 jul. 2005 e "Fundos de pensão contratam antigos sócios de Gushiken", Folha de S. Paulo, 3 jul. 2005, Primeiro Caderno, p. 12.

Há indícios de que a influência de Gushiken não diminuiu após sua saída do governo. Segundo o jornal O Estado de S. Paulo: da "lista dos dez maiores fundos de pensão de estatais brasileiras, seis estão sob comando do PT e a maioria deles ainda é dirigida por apadrinhados dos ex-ministros petistas José Dirceu e Luiz Gushiken, que deixaram o governo há quase quatro anos, em meio ao escândalo do mensalão" ("Dirceu e Gushiken ainda dão as cartas nos fundos", O Estado de S. Paulo, 4 mar. 2009).

(3) Ranier Bragon: "PT tem diretores em 7 dos 10 maiores fundos", Folha de S. Paulo, 8 março de 2009.

(4) Aliás, o silêncio da CUT a respeito das greves operárias nas obras do PAC, especialmente em Jirau, sem mencionar sua completa inação após o anúncio da empresa Camargo Corrêa de demitir 4.000 trabalhadores, poucas horas depois de um acordo coletivo com a mesma empresa ter sido celebrado pela central, obviamente não são produtos de sua súbita inexperiência à mesa de negociação. Muito ao contrário: a iminência de grandes eventos como a Copa do Mundo, em 2014, e as Olimpíadas do Rio, em 2016, aumenta exponencialmente a demanda por investimentos em infra-estrutura que dependem fundamentalmente do capital estatal e dos fundos salariais. Desde que não haja atrasos nas obras, o que implica, naturalmente, na "pacificação" dos canteiros e na supressão de movimentos grevistas, trata-se de lucro líquido e certo para a burocracia sindical financeirizada. Ainda que às custas da crescente degradação das condições de trabalho nos canteiros de obras.

Alvaro Bianchi é professor do Departamento de Ciência Política da Universidade Estadual de Campinas; Ruy Braga é professor do Departamento de Sociologia da Universidade de São Paulo.

Fonte: http://www.correiocidadania.com.br/content/view/5816/9/

Antissemitismo?


Em memória de Simón Radowitzky e Raymundo Gleyzer

Néstor Kohan

Conheci pessoalmente Néstor Kohan, em Caracas, há dois meses, quando ambos participamos de duas mesas em eventos promovidos pelo Movimento Continental Bolivariano: um seminário sobre Marx e um ato público pelo Dia do Direito à Rebelião dos Povos.

Convivemos alguns dias e surgiu logo uma grande empatia. Conversamos muito, numa mistura de espanhol e português. Mas nos entendemos bem e descobrimos muitas identidades em nossa visão do mundo. Jamais perceberia sua origem familiar e étnica, se ele não me autorizasse a traduzir e publicar o seu texto abaixo. Mandou-me em solidariedade ao PCB, acusado recentemente de antissemita. Sabia apenas do detalhe de que o marxista Néstor é argentino, como podia ser brasileiro, afegão, angolano: afinal, ele é um internacionalista. Mas conhecer mais este detalhe sobre o camarada Nestor me faz ficar mais orgulhoso de o ter conhecido.

Ivan Pinheiro

Os fatos

O que se sabe: saiu publicado na capa do Clarín e foi exibido em vários canais de televisão. Na Argentina, ocorreu um pequeníssimo ato – algumas poucas centenas de pessoas, não chegavam a quinhentas –, em comemoração ao estado Israel, organizado pela embaixada desse país junto com o governo portenho da direita neoliberal clássica, vinculada ao empresário Maurício Macri. Um grupo muito pequeno de manifestantes – menos de duas dezenas – tentavam divergir do sionismo, distribuindo panfletos no ato. Armou-se um alvoroço. Repressão policial. Os manifestantes, críticos do sionismo, foram golpeados e presos. Uma brutal campanha midiática para ilegalizar a esquerda. A acusação central: “anti-semitismo”. Perseguições, invasões, prisões, julgamentos. Tentativa de eliminar projetos sociais e os questionamentos de todo movimento piqueteiro não-oficial.

Sob pressão da embaixada do estado de Israel e da embaixada dos Estados Unidos na Argentina, o governo de Cristina Kirchner e os juízes invadiram um local piqueteiro, na cidade de Buenos Aires, prenderam outros dez militantes, mais os que já estavam presos pelo ato. Histeria midiática acusa toda a esquerda não institucional – principalmente de origem marxista – de... “anti-semita”.

Quem escreve e quem opina?

Alguns anti-semitas dissimulam e escondem seus preconceitos com o confuso e manipulado “tenho um amigo judeu”. Eu não tenho um amigo judeu. Simplesmente, parte de minha família foi torturada e massacrada pelos genocidas nazistas (genocídio que não teve nada de “holocausto”. Não foi “um castigo de Deus”, mas sim um empreendimento político bem mundano e terreno, planejado e executado de forma burocrática, a partir de um projeto de reordenamento e contra-revolução capitalista, de cobrança europeia ocidental, cujas pretensões imperialistas apontavam para todo o planeta). Mesmo se minha família não tivesse sofrido esse genocídio na própria carne, teria, igualmente, o direito de opinar.

Nosso vínculo com os presos

Conhecemos muitos deles e delas. Com alguns, compartilhamos militância, formação política e estudo durante anos e décadas, nos bairros da periferia, da cidade de Buenos Aires, na Argentina. Da mesma forma, nas escolas de formação política do Movimento Sem Terra (MST), no Brasil. Assim como em atividades conjuntas com povos originários e indígenas da Bolívia. Todos nos conhecemos bem, principalmente, os companheiros do Movimento Teresa Rodríguez (MTR).

Assistiram nossa Cátedra Che Guevara durante anos: primeiro, na Universidade Popular Madres de Plaza de Mayo, depois, no Hotel Bauen.

Precisamente no local invadido pela polícia, conhecido no bairro Florencio Varela (um dos mais humildes da cidade de Buenos Aires) como Conselho de Castelli, criamos uma escola de formação política para moradores com estes companheiros que hoje estão na prisão, acusados de “anti-semitas”. A escola foi feita de maneira totalmente gratuita, absolutamente voluntária, sem cobrar, jamais, um só peso.

Com as pessoas das comunidades, líamos e estudávamos Antonio Gramsci e Che Guevara. Gravíssimo! Terrível! Também discutíamos sobre história argentina. Assistíamos a filmes com os moradores dos bairros, donas de casa, trabalhadores empregados, trabalhadores desempregados, rapazes e moças humildes, da classe trabalhadora. Por exemplo, vimos e discutimos “Os traidores”, de Raymundo Gleyzer (o que terão sentido com relação ao filme aqueles que hoje prendem estes companheiros?). Fizemos com estes companheiros, algumas vezes, oficinas de filosofia nos bairros, onde, juntos com trabalhadores e trabalhadoras, donas de casa e muitos jovens, analisamos o capítulo sete do livro Cosmos, do pesquisador, professor e astrônomo da NASA (instituição norte-americana, senhor embaixador dos Estados Unidos... Sim, norte-americana... Que horror!), Carl Sagan: “O espinhaço da noite”. Gravíssimo! Perigo! Turmas de filosofia nas periferias? No meio da rua das comunidades? Em meio a crianças correndo e com cachorros latindo ao redor? Inconcebível! Gravíssimo! A filosofia é para as crianças da elite, não para gente humilde e para trabalhadores de comunidades. Terroristas! Inadaptados! Autoritários! Como ousam socializar o saber? Subversivos! Deveríamos voltar a falar latim para que a cultura seja para poucos! Loucos-varridos!

A demonização midiática é tremenda. Apresentam estes companheiros como se fossem os obscuros e monstruosos “terroristas” dos filmes mais baratos de Hollywood. Conhecemos bem esses companheiros. Se não fosse trágico, daríamos boas risadas. Certamente, riremos juntos quando estes companheiros saírem do cárcere...

O estado de Israel defende o povo judeu?

Os acusam de “anti-semitas”? Israel protege o povo judeu? A embaixada de Israel e a embaixada ianque da Argentina são os «pais» do povo judeu?

O estado de Israel fala hoje em nome das vítimas do genocídio nazista, dos sobreviventes e de suas famílias. Para legitimar-se, se auto-intitula “protetor” dos judeus, além de representante dos familiares e vítimas do nazismo.

Pensemos um pouco. Façamos memória.

Se Israel nos protege, não entendo porque o estado de Israel foi um aliado estreito e fiel de Videla e Massera, ditadores simpatizantes de Adolf Hitler (como todas as Forças Armadas argentinas, segundo demonstra o documentário «Panteón militar», do historiador e jornalista periodista Osvaldo Bayer). O general Videla era um católico ultraconservador, que preconizava a guerra contra-insurgente como se fosse uma guerra santa contra os ateus marxistas. Todos os manuais de ensino médio daquela época comprovam isso. Por sua vez, almirante Massera era integrante da organização neonazista P2. Por que o estado de Israel tinha uma aliança tão estreita com esta ditadura militar?

Nessa época, o Movimento Judeu pelos Direitos Humanos (MJDH) havia calculado que, dos 30.000 desaparecidos e desaparecidas na Argentina, aproximadamente entre 1.500 e 2.000, eram de origem judia. Uma proporção bastante maior (na realidade, corresponde a 16 vezes mais) se comparar a relação quantitativa da comunidade judia com o conjunto da população total de nosso país. Não foi casual.

Isso é explicado, ao menos, por duas razões. Em primeiro lugar, pela ativa militância do judaísmo progressista e de esquerda nas organizações revolucionárias argentinas (incluindo as político-militares PRT-ERP, FAR, Montoneros e outras similares). Em segundo lugar, pelo caráter brutalmente anti-semita dos militares argentinos. Existem numerosos testemunhos, por exemplo, no Nunca mais (um livro que não possui posições de “ultra-esquerda” precisamente, já que o prólogo de Ernesto Sábato tristemente fortaleceu a célebre “teoria dos dois demônios”), sobre a ira especial dos torturadores militares com os prisioneiros e sequestrados de origem judia, as torturas “especiais”, as marchas nazistas que eles faziam escutar nas câmaras de torturas, etc. O general Camps, chefe policial que se responsabilizou pelo desaparecimento e assassinato de 5.000 prisioneiros, era um confesso anti-semita. Sempre que podia, expressava seu ódio aos judeus. Não era o único, apenas um dos mais conhecidos e cínicos.

O que fez o estado de Israel para proteger não os 30.000 desaparecidos e desaparecidas em geral, mas, especialmente, os 1.500 ou 2.000 desaparecidos judeus?

Segundo reconhece Pinjas Avivi, o então cônsul da embaixada do estado de Israel na Argentina (entre 1978 e 1981), quando acompanhou o jornalista Jacobo Timerman (um dos poucos, talvez o único, que conseguiu se salvar) ao aeroporto de Ezeiza, pediu que não denunciasse a ditadura e as tremendas torturas sofridas... Mas o contrário! “Pedi-lhe que não atacasse o governo militar porque nosso trabalho corria perigo” (Página 12, 8/9/2001). O funcionário israelense reconhece que este tipo de atitude correspondia a: “não queríamos prejudicar as relações diplomáticas entre Israel e Argentina”. O mesmo funcionário diz que “houve detidos que recusaram nossa ajuda. Eles nos acusaram: vocês são colonialistas, genocidas e conquistadores. Não queremos a ajuda de vocês. São piores que os generais»” (http://www.hagshama.org.il [1/2/2000]). Iosi Sarid, um dos deputados de Israel da Frente de Esquerda Meretz, revelou que nos arquivos da chancelaria israelense e no ministério de Defesa de Israel, existem provas que negam a versão acerca da suposta “ignorância” do estado de Israel a respeito dos massivos desaparecimentos, sequestros e torturas de judeus na Argentina, “provas que trataram de ocultar para não incomodar as «boas relações» e, entre elas, a venda de armas” (18/11/2003, www.wzo.org.il).

A colaboração do estado de Israel – venda de armas, votos da ditadura a favor de Israel nas Nações Unidas, etc. – com a ditadura militar, genocida e anti-semita do general Videla não foi uma exceção. O mesmo aconteceu com outros regimes fascistas ou de extrema direita, como os de Augusto Pinochet (que usava o uniforme nazista) no Chile, Anastasio Somoza, na Nicarágua, ou o regime neonazista do apartheid, na África do Sul. Todos estreitos aliados, como Israel, da cabeça da serpente mãe extremista, o estado norte-americano: USA. Uma casualidade?

O apoio entusiasta à Somoza tinha a ver com “a defesa do judaísmo”? Os comandos israelenses hoje combatem a insurgência marxista das FARC-EP ou assessoram os narco-militares de Uribe nas selvas e montanhas da Colômbia para “defender os judeus”? Quais são os judeus que vivem nas montanhas ou selvas da Colômbia? Queremos conhecê-los para compartilhar algumas comidas ou assistirmos juntos alguns filmes de Woody Allen!

Quando o famoso intelectual norte-americano Noam Chomsky (de origem judia, que viveu vários anos em Israel e que de lá saiu sumamente decepcionado e amargurado) afirmou que as FARC-EP da Colômbia não são terroristas e que, em contrapartida, a política oficial do estado de Israel é de extrema direita, não somente no Oriente, mas em todo mundo, será ele, por acaso, um “terrorista anti-semita”?

Longe da tradição humanista de Sigmund Freud, Albert Einstein e Karl Marx, que soube defender o querido escritor judeu Isaac Deutscher, hoje Israel faz culto à limpeza étnica e à discriminação, constrói um muro de intolerância (pelo qual ninguém se “ofende”, como ocorreu hipocritamente com o muro de Berlim...), legaliza a monstruosidade da tortura (chamando-a com o mesmo eufemismo utilizado pelos “democratas” norte-americanos: “interrogatórios fortes”) e pratica sobre os demais o mesmo que o povo judeu sofreu na própria carne. Como bem alertou em sua época o pensador judeu Martín Buber: “Deveremos enfrentar a realidade de que Israel não está inocente nem redentora. E que em toda sua criação e expansão, nós judeus temos causado o que sofremos historicamente: uma população de refugiados na diáspora”.

Como escreveu em seu livro Ser judeu o filósofo judeu e marxista argentino, León Rozitchner: “Que estranha inversão se produziu nas entranhas desse povo humilhado, perseguido, assassinado, para humilhar, perseguir e assassinar aqueles que reclamam o mesmo que os judeus reclamavam antes para si mesmos? Que estranha vitória póstuma do nazismo, que estranha destruição inseminou a barbárie nazista no espírito judeu? Que estranha capacidade volta a despertar neste apoderar dos territórios distantes, onde a segurança que se reclama é, no fundo, a destruição e dominação do outro pela força e pelo terror? Se vê, então, que quando o estado de Israel enviava suas armas aos regimes da América Latina e da África, já ali era visível a nova e estúpida coerência dos que se identificam com seus próprios perseguidores. Não esqueceremos os judeus latino-americanos. Tampouco esqueceremos Chatila e Sabra”.

Quem é o inimigo?

Permitem-nos um conselho? Aos jovens do MOSSAD e das Forças Armadas de Israel, humildemente, sugerimos que se o que buscam é adrenalina e vingança pelos ferozes assassinatos nazistas do passado contra o povo judeu, pois bem, então, por que não planificar e preparar-se para atacar, de forma mortífera e demolidora, as grandes empresas europeias e norte-americanas que se enriqueceram com o genocídio nazista? Como bem explica o formidável livro Negócios são negócios. Os empresários que financiaram a ascensão de Hitler ao poder, do escritor judeu Daniel Muchnik, o nazismo não foi uma “anomalia”.

As hierarquias políticas, militares e ideológicas do nazismo são conhecidas: Hermann Göring, Joseph Goebbels, Ernst Röhm, Alfred Rosemberg, Ulrich F.J.von Ribbentrop, Heinrich Himmler, Rudolf Hess, Gottfried Feder, Josef Mengele, entre outros. No entanto, muito menos o são os empresários beneficiários-cúmplices, sócios de interesses, aliados ou colaboracionistas do nazismo na Alemanha.

A lista é longa e Muchnik a percorre minuciosamente. Entre outros, inclui as empresas Siemens (elétrica), a BMW e a Volkswagen (automotivas), Fritz Thyssen (industrial siderúrgico que morreu em Buenos Aires, em 1951), Gustav Krupp (dono da gigante do aço alemão), Ernst Heinkel (“führer econômico-militar” desde 1938) e Emil Kirdorf (empresário do carvão). Estes empresários, recorda amargamente Muchnik, que utilizavam mão de obra escrava dos prisioneiros judeus, comunistas ou ciganos, saíram ilesos dos julgamentos de Nuremberg... Uma mera casualidade?

Por acaso, hoje em dia – volta a perguntar-se Muchnik – não continuam operando com total impunidade empresas de origem nazista (derivadas da IG Farben, que fabricava o raticida das câmaras de gás) como a Bayer, a Hoesch ou a BASF, acusadas por sobreviventes do genocídio nazista?

Muchnik apresenta, então, uma quantidade enorme de dados sobre a colaboração sistemática, os negócios ou, inclusive, a simpatia ideológica que mantiveram com Hitler – ainda durante a segunda guerra mundial – empresas como a General Motors (associada com IG Farben), a General Electric, a Brown Boveri (filial de Westing House), a britânica Unilever, a Shell, a United Steel, o Chase Manhattan Bank de Rockefeller, a Standard Oil, a TEXACO, a ITT (a mesma do golpe de estado de 1973, no Chile), o National City Bank, o grupo editorial Bertelsman, dono da RCA e acionista majoritário do American On Line (o principal provedor de Internet dos EUA) e a Ford. Todos eles se encheram de dinheiro com o nazismo e, hoje, em pleno século XXI, continuam engordando suas contas bancárias e suas ações com total impunidade!

Aí, os jovens do MOSSAD e das Forças Armadas de Israel teriam que atacar e dirigir sua violência mortal, não aos refugiados palestinos, não às escolas palestinas, não aos hospitais palestinos, não às famílias palestinas... O inimigo tampouco são os piqueteiros da Argentina, a insurgência da Colômbia, os negros da África do Sul. O inimigo são as grandes empresas que ganharam fortunas com o nazismo.

Jovens, confundiram-se de inimigos ou vocês são amigos e cúmplices desse inimigo? Leiam esse livro, “desinformados” jovens do MOSSAD...

Os revolucionários são “terroristas anti-semitas”?

A literatura sionista, a grande imprensa do poder (monopólico), a embaixada dos Estados Unidos e a embaixada de Israel estão construindo um grande sofisma. Todo revolucionário é... “um terrorista”. Quando se questiona a política de estado de Israel ou dos Estados Unidos é, além disso, um “terrorista anti-semita”.

Como os dirigentes sionistas e os monopólios de (in)comunicação chamariam um dos principais fundadores das FAR (Forças Armadas Revolucionárias) da Argentina dos anos 70, o militante de origem judia e comunista Marcos Osatinsky? Marcos Osatinsky não só era guevarista, como promovia uma opção político-militar, era aliado de Cuba e defendia a causa palestina. Esteve preso pela ditadura militar no cárcere de Rawson, escapou do “massacre de Trelew”, passou pelo Chile de Salvador Allende e chegou a Cuba, onde desenvolveu trabalhos voluntários e foi fotografado com Mario Robi Santucho e outros revolucionários antiimperialistas daquela época. Este grande revolucionário de origem judia está desaparecido. Marcos era um “terrorista anti-semita”?

Como os dirigentes sionistas e os monopólios de (in)comunicação chamariam o jovem trabalhador judeu libertário Simón Radowitzky? Radowitzky, em começos do século, justiçou com um explosivo o feroz coronel da polícia, Ramón Falcón, quando este último massacrou trabalhadores indefesos durante um ato pelo primeiro de maio, numa praça portenha. Simón Radowitzky foi castigado com mais de duas décadas de torturas, vexames e reclusão nas piores prisões do sul argentino. Depois da deportação para Montevidéu, marchou para combater, com as armas em punho, junto aos batalhões internacionalistas da guerra civil espanhola. Simón era um “terrorista anti-semitista”?

Como os dirigentes sionistas e os monopólios de (in)comunicação chamariam Teresa Israel, jovem advogada de guerrilheiros e militantes populares? Esta jovem judia comunista, advogada de presos políticos, foi uma das mais audazes que incursionou no tenebroso quartel militar de Campo de Mayo, denunciando as torturas dos detidos. Nos anos 70, se metia nos quartéis para tentar salvar a vida dos revolucionários sequestrados e torturados pelos militares argentinos (aliados do estado de Israel). Hoje está desaparecida. Muitos centros culturais e comunitários levam o nome de Teresa, jovem judia revolucionária. Teresa era uma “terrorista anti-semita”?

Como os dirigentes sionistas e os monopólios de (in)comunicação chamariam Raymundo Gleyzer? Era um jovem militante judeu, comunista e combatente do guevarista Partido Revolucionário dos Trabalhadores-Exército Revolucionário do Povo (PRT-ERP). Na casa de Raymundo, fundou-se o teatro IFT, um dos baluartes culturais do judaísmo progressista argentino, hoje situado no bairro de Once. Raymundo, brilhante e apaixonado, dirigiu o grupo Cine da Base e foi o grande cineasta da insurgência argentina, amiga da causa palestina. Raymundo era um “terrorista anti-semita”?

A lista de exemplos segue e é incontável. Não só da Argentina, mas de toda a América Latina e do mundo.

O jovem dirigente uruguaio Jorge Zabalza, que começou militando no agrupamento judeu Hashomer Hatzair, visitou Israel, viveu num kibbutz e, ao regressar, se converteu num dos comandantes e num dos nove reféns históricos do Uruguai, pertencentes ao Movimento de Libertação Nacional – Tupamaros, organização amiga da causa palestina. O «tambero», como o chamam no Uruguai, é um “terrorista anti-semita”?

E Mauricio Rozencof, igualmente judeu, outro dos fundadores dos Tupamaros do Uruguai? Era um “terrorista anti-semita”?

E Enrique Oltusky, jovem militante judeu cubano, que se converteu em estreito colaborador do comandante Ernesto Che Guevara (Oltusky, junto com seu amigo Orlando Borrego, foi o organizador das Obras Completas do Che, conhecidas pelo título O Che na revolução cubana. Os três, Oltusky, Borrego e Guevara, estudaram juntos O Capital, em Cuba). Como seu chefe Guevara, Oltusky era amigo da causa palestina. Era Enrique um “terrorista anti-semita”?

E se formos ainda mais para trás... O jovem guerrilheiro socialista Mordejai Anielevich que, enquanto os grandes papas do sionismo negociavam com os nazistas, organizava no gueto de Varsóvia o único caminho para enfrentar os fascistas, isto é, com luta armada... Era um “terrorista anti-semita”?

A criminalização macarthista dos revolucionários – especialmente daqueles que possuem ou assumem posições radicalizadas – e a falácia de identificá-los com o brutal e monstruoso anti-semitismo de origem nazista, não possui como base a menor análise histórica. Visa, unicamente, a condição de apagar, não só a heróica resistência palestina, mas, inclusive, a própria história de honra e valentia do judaísmo revolucionário e socialista – impulsionador da luta armada. Como se pode aceitar a propaganda oficial do MOSSAD, o estado de Israel e a embaixada dos Estados Unidos?

A esquerda piqueteira é “anti-semita”?

Todavia, hoje permanece sem solução o atentado à AMIA. Enquanto a direção oficial do sionismo se abraçava com os políticos do sistema e aplaudia o presidente Carlos Saúl Menem, todo mundo sabia que estava em processo um atentado. Atentado que não se fez nos bairros onde viviam os judeus ricos e milionários, mas no bairro Onde, um dos mais populares da cidade de Buenos Aires (precisamente o mesmo bairro onde, em princípios do século XX, teve lugar a “semana trágica”, quando os “bons filhos” dos empresários e as tropas para-policiais reprimiram trabalhadores insurretos e caçaram “judeus bolcheviques”, humilhando mulheres e crianças, assassinando, à sangue frio, em nome da “pátria”). No local do atentado à AMIA, todo mundo suspeitava que a polícia da cidade de Buenos Aires, conhecida popularmente como “a bonaerense”, havia posto sua garra suja e corrupta ali. Também se suspeitou que os militares caras-pintadas – ex-instrutores de contra-insurgência nas escolas ianques do canal do Panamá – tinham colaborado.

Porém, a ninguém, absolutamente a ninguém, nem sequer aos mais delirantes, ocorreu que o movimento piqueteiro esteve misturado com o atentado à AMIA.

Então, por que agora esse ódio e essa histeria que vemos em todos os monopólios da (in)comunicação contra a esquerda piqueteira?

Pedimos permissão para contar uma história. Há alguns anos, uma das organizações de vítimas do atentado à AMIA, os companheiros da APEMIA, organizaram um ato nas ruas Corrientes e Pasteur, no bairro de Once, Capital Federal da Argentina. O ato teve bastante concorrência. Quando um trabalhador morocho e muito humilde do Pólo Obrero tentou subir no palanque para solidarizar-se com as famílias das vítimas, alguns sionistas que estavam na plateia começaram a insultá-lo, vaiá-lo e tentaram tirá-lo. Quase nos agarramos a golpes.

Por que esse ódio de classe? Ao sionismo interessa o povo judeu ou, na realidade, defende seus próprios interesses, inclusive contra os próprios judeus? Se, de verdade, interessa o bem-estar dos judeus, NUNCA, repito, NUNCA deveriam ter apoiado uma ditadura anti-semita como a de Videla e Massera.

O sionismo nos protege?

Peço permissão para contar outra história pessoal, esta da adolescência. Ocorreu numa escola secundária, onde militávamos no grêmio estudantil. Alguns de nossos amigos eram judeus, outros católicos e um companheiro de origem árabe, ainda que de fé católica. Sem renegar nossa origem, nós éramos (e somos) ateus. No entanto, aproveitando o “dia do perdão”, faltamos à aula, como grande parte dos adolescentes, tentando escapar da disciplina escolar. Junto com os de sobrenome judeu, também faltaram nosso amigos de origem católica e o de origem árabe. O que esse grupo de amigos encontrou no dia seguinte, ao regressar à aula? Em cada uma de nossas cadeiras de madeira haviam pintado uma imensa cruz suástica (nazista), de cor vermelha, com cada um de nossos nomes. A primeira reação, instintiva, foi irmos fechando os punhos. Porém, rapidamente, pensando politicamente, como militantes do grêmio estudantil. Fizemos uma denúncia pública contra este gravíssimo ato antissemita. Como dirigentes do grêmio estudantil, recorremos a inúmeros jornais. Ninguém publicou nada. O único jornal que publicou a denúncia foi Nueva Presencia, órgão jornalístico que havia sido, nos tempos ditatoriais, baluarte cultural da resistência popular. Dirigido pelo jornalista Herman Schiller (conheci Herman pessoalmente muitos anos depois, já militando com as madres de plaza de mayo), Nueva presencia deu lugar em suas páginas à colorida família da esquerda argentina, judia e não judia.

Imediatamente depois da denúncia, vieram à escola alguns dirigentes sionistas. Não recordo agora se eram da OSA ou da DAIA. Porém, era um dirigente de peso e renome. Veio averiguar e pedir explicações pelo feito anti-semita. O reitor da escola, fascista disfarçado de liberal, jurista legitimador dos golpes de estado e colunista do jornal de extrema-direita La Prensa, chamou os estudantes agredidos e também o agressor (que veio junto com seu pai), que tinha pintado as cruzes nazistas. Em meio à discussão, o reitor disse ao dirigente sionista, apontando-me com o braço estendido: “Porque este estudante é marxista e milita no fascismo vermelho”. Automaticamente, seus olhos se cruzaram com os do dirigente sionista. Nesse instante, esqueceram-se do jovem neonazista, das cruzes suásticas, da agressão anti-semita e começaram a me insultar. Eu não entendia nada. Não vinha nos defender dos nazistas? Nós não éramos os atacados? Não! Para o dirigente sionista, que não era um jovem ignorante, mas um alto dirigente do sionismo argentino, era mais perigoso um estudante marxista judeu que um nazista que pintava suásticas... Incrível!!! Naquela época eu era muito garoto. Não entendi nada. A situação me parecia um absurdo e absolutamente ridícula. De agredido e denunciante, eu tinha terminado sendo acusado... Nada menos que por outro judeu! Anos depois, o compreendi muito bem...

Os palestinos nos odeiam?

Os palestinos nos odeiam? Não é certo. Gravíssimo erro confundir judaísmo com sionismo. Confusão claramente falsa, exercida em defesa do estado de Israel ou contra Israel. A resistência palestina – ao menos em suas vertentes e organizações mais lúcidas, as oriundas de um tronco antiimperialista laico e socialista – luta contra a política de estado de Israel, não contra os judeus em geral.

Se me permite, gostaria de contar uma terceira história para ilustrar este pensamento.

Quando se inaugurou a Escola Nacional «Florestan Fernandes», em São Paulo, por iniciativa do Movimento Sem Terra (MST) do Brasil, encontramos militantes de muitas partes do mundo, todos unidos pelas mesmas bandeiras e os mesmos ideais, os mais nobres conhecidos pela humanidade até o momento. Existiam, entre inúmeras pessoas, judeus não israelenses. Também estavam presentes alguns marxistas israelenses e, igualmente, mães palestinas. Estas últimas, vestidas com seus lenços e túnicas tradicionais. Todavia, recordo com uma emoção indescritível o imenso abraço internacionalista e fraterno que estas mães nos deram, a todos e todas por igual, incluindo os judeus não israelenses e os marxistas de Israel, sabendo perfeitamente quem era cada um. Ninguém me contou. Não li em nenhum livro. Não vi em nenhum filme. Esse abraço íntimo, afetuoso e fraternal de palestinas e judeus, palestinos e judias, simbolizou para nós um avanço, de como poderíamos viver e conviver se, neste mundo cruel e mesquinho não governassem o imperialismo e as burguesias, com todo seu primitivismo político, ódio racial, opressão nacional e fanatismo religioso, mas como povos organizados sobre um projeto socialista de alcance mundial. Não é um sonho delirante. É algo possível e ao alcance das mãos, com a condição de tirarmos de cima os donos do poder burguês, do mercado, do capital e da guerra fratricida.

Por isto tudo, pedimos aos senhores defensores do sionismo que façam toda a propaganda que queiram, mas, por favor...

Já basta! Não façam em nosso nome!

Não usem a memória dos nossos avós e bisavós torturados, perseguidos e massacrados pelo nazismo, para fins mesquinhos, egoístas e indefensáveis!

Viva a causa dos irmãos e irmãs palestinas!

Viva o socialismo!

Liberdade a todos as presas e presos políticos!

23 de maio de 2009

Autor: Néstor Kohan

Tradução: Maria Fernanda M. Scelza

* Montoneros (Guerrilla de origen peronista revolucionaria, nacionalista radical)

* PRT-ERP (Partido Revolucionario de los Trabajadores – Ejército Revolucinario del Pueblo)

* Cine de la Base: expresión cinematográfica de la guerrilla marxista

* FAR (Fuerzas Armadas Revolucionarias)

* PC: Partido Comunista

* Ashomer Atzair: La joven guardia

* MLN Tupamaros: Movimiento de Liberación Nacional Tupamaros (de Uruguay)

* MOSSAD (En hebreo ha-Mossad, acronismo de le-Modiin ule-Tafkidim Meyuhadim, (Instituto para Inteligencia y Operaciones Especiales). son los servicios de Israel)

* IFT: El Teatro IFT es miembro del ICUF -Federación de Entidades Culturales Judías de Argentina- ( la vertiente del Partido Comunista al interior de la comunidad judia argentina, en ese espacio se solía hablar el idioma judía de la diáspora idish, además del castellano, y no se hablaba el hebreo) y de ARTEI -Asociación Argentina del Teatro Independiente.-

* DAIA: Delegación de Asociaciones Israelitas Argentinas (sionista)

* AMIA: Asociación Mutual Israelita Argentina (sionista)

* A.P.E.M.I.A: Agrupacion Por el Esclarecimiento de la Masacre Impune de la AMIA (http://apemia.blogspot.com/ fracción encabezada por Laura Ginsberg, de izquierda, enfrentada a la direccion del sionismo local y de todos los gobiernos (Menem, De la Rua, Kirchner)

* Polo Obrero: Expresión piquetera del Partido Obrero (trotskista)

* "La Bonaerense: Expresión popular para referirse a la policia de la provincia de Buenos Aires.

* Carapintadas: Corriente de las Fuerzas Armadas, de pose y retórica "nacionalsita" enfrentada a los militares liberales. Sus líderes fueron instructores en contrainsugencia en las escuelas yanquis de Panamá

Sobrevivente do massacre de Corumbiara é morto em RO


Da Página da CPT

Adelino Ramos, conhecido como Dinho, sobrevivente do Massacre de Corumbiara, ocorrido em agosto de 1995, foi assassinado nesta sexta-feira (27), por volta das 10h, em Vista Alegre do Abunã, na região da Ponta de Abunã, município de Porto Velho (RO)

Ele foi morto enquanto vendia as verduras produzidas no acampamento onde vivia. Ele foi morto por um motoqueiro, próximo ao carro da família onde estavam sua esposa e duas filhas.

Dinho vinha denunciando a ação de madeireiros na região da fronteira entre os estados de Acre, Amazônia e Rondônia. Ele e um grupo de trabalhadores reivindicavam uma área nessa região para a criação de um assentamento.

No início desse mês, o Ibama iniciou uma operação no local, onde apreendeu madeira e cabeças de gado que estavam em áreas de preservação. Segundo a CPT na região, isso leva a crer que esse tenha sido o motivo de sua morte.

Dinho vinha sendo ameaçado há anos e em reunião realizada em julho do ano passado em Manaus (AM), com o ouvidor agrário nacional, Gercino Silva, denunciou as ameaças contra sua vida e o risco que corria. Dinho foi líder do Movimento Camponês de Corumbiara.

Fonte: http://www.mst.org.br/node/11841

26 de maio de 2011

SIONISTAS TENTAM CRIMINALIZAR O PCB E CASSAR O REGISTRO DO PARTIDO NO TSE

SIONISTAS TENTAM CRIMINALIZAR O PCB E CASSAR O REGISTRO DO PARTIDO NO TSE

imagemCrédito: t2.gstatic.com


(Nota Política do PCB)

Fomos informados de que uma entidade chamada CONIB (Confederação Israelita do Brasil) teria formalizado, no início deste mês, representação contra o PCB (Partido Comunista Brasileiro), junto ao TSE, alegando prática de “antissemitismo”, por ter a página do partido na internet publicado artigo denominado “Os Donos do Sistema: o Poder Oculto; de Onde Nasce a Impunidade de Israel”.

Na apresentação de seu portal, a entidade se assume sionista, posiciona-se “na linha de frente do combate ao antissemitismo” e oferece “links” para todas as organizações sionistas de Israel, dos Estados Unidos e de âmbito mundial ou nacionais, a imensa maioria de direita.

Apesar de ainda não conhecermos os termos da representação (não divulgada pela entidade), inferimos que sua verdadeira intenção é tentar cassar o registro do PCB, como se se fosse possível calar a voz dos verdadeiros comunistas brasileiros. Nosso partido – o mais antigo do Brasil, fundado em 1922 - foi escolhido criteriosamente para esta ofensiva por razões que nos orgulham. Além de lutarmos pela superação do capitalismo, praticamos com firmeza e independência o internacionalismo proletário, a solidariedade a todos os povos em luta contra o imperialismo e o sionismo, cujo significado não se refere ao seu conteúdo original, mas ao caráter atual do movimento, hegemonicamente fascista e imperialista.

A nosso ver, trata-se de uma ação política, muito mais do que jurídica.

O texto que provocou a reação da CONIB é de autoria do jornalista argentino Manuel Freytas, divulgado originalmente no sítio eletrônico IAR Notícias, e reproduzido mundialmente em pelo menos mais de trinta portais progressistas e anti-imperialistas, listados ao final desta nota.

Segundo a apócrifa nota publicada pela citada CONIB (www.conib.org.br), o texto se utiliza “de imagens apelativas, distorções da realidade e argumentos conspiratórios e claramente anti-semitas”, revelando “alto grau de desconhecimento do cenário político-econômico internacional”, por repetir (agora no século 21!) chavões da obra “Os Protocolos dos Sábios de Sião, farsa montada pela polícia czarista da Rússia, no século 19”. Assim, o PCB é acusado de “incentivar a discriminação e a proliferação da intolerância religiosa, étnica e racial em nosso país”.

Termina a nota afirmando que a representação baseia-se na Lei Orgânica dos Partidos Políticos, com a “finalidade de evitar que abusos e inverdades desencadeiem preconceitos contra a comunidade judaica brasileira”.

Diante deste fato, o PCB vem a público se pronunciar:

1 – O PCB não se intimidará diante da pressão de organizações sionistas de direita e continuará prestando ampla, geral e irrestrita solidariedade ao povo palestino, vítima da escandalosa impunidade de Israel, tema do artigo considerado ofensivo. Desrespeitando todas as Resoluções da ONU, o estado israelense continua ampliando a ocupação de territórios dos palestinos, derrubando suas casas, criando o chamado “Muro do Apartheid”, invadindo e cercando a Faixa de Gaza, onde impede a entrada de ajuda humanitária (inclusive alimentos e medicamentos), assassinando e prendendo militantes palestinos, mantendo mais de 11.000 deles em condições abjetas em seus cárceres. Mais do que isso, continuaremos a denunciar que Israel se transformou numa enorme base militar norte-americana no Oriente Médio. O país é o primeiro destino da ajuda militar estadunidense no mundo e o único do Oriente Médio a ter direito a armas nucleares, sem permitir a inspeção internacional que exige de outros países.

2 – Esta ofensiva contra o PCB se deve ao fato de que apoiamos e participamos dos diversos Comitês de Solidariedade ao Povo Palestino que se consolidam e se multiplicam pelo Brasil. No nosso portal, este texto foi escolhido aleatoriamente, pois com uma simples pesquisa se pode verificar que ali os artigos e informações sobre a luta contra a política terrorista do Estado de Israel se contam às centenas, muitos deles mais contundentes que o escolhido para ofender a liberdade de imprensa consagrada em nosso país e tentar intimidar e criminalizar o PCB. Publicamo-lo exatamente há um ano, mas só agora ele foi “descoberto”.

3 – É significativo que esta atitude intimidatória (que está se dando em vários países) ocorra no exato momento em que as duas maiores organizações políticas palestinas (Fatah e Hamas) anunciam a retomada de seus entendimentos e o desejo de dividir a responsabilidade pela administração dos territórios palestinos, que foram separados arbitrariamente pelas forças militares israelenses com o uso da violência e da ocupação.

4 – A unidade dessas duas organizações contraria os planos imperialistas de divisão sectária entre os palestinos – exatamente porque cria melhores condições para o reconhecimento internacional do Estado Palestino e para uma negociação pela paz na região -, tudo que Israel não deseja, apesar das reiteradas resoluções da ONU nesse sentido.

5 – Esta atitude arbitrária de perseguição política coincide também com a satanização do mundo muçulmano, este sim vítima de preconceitos e estigmatização, sem que a mídia burguesa se utilize de expressões como “anti-islamismo”, “anti-xiitismo”, “anti-sunitismo” etc. Coincide também com a proximidade da Assembleia Geral da ONU que, no próximo mês de setembro, discutirá o reconhecimento do Estado Palestino.

6 - Coincide ainda com a movimentação imperialista para ampliar seletivamente a agressão militar no Norte da África e no Oriente Médio, para além do Iraque e do Afeganistão. Coincide com a descarada intervenção militar na Líbia, com as provocações contra a Síria e o Irã, acusados de solidários aos palestinos e de apoio ao “terrorismo”.

7 - As raivosas declarações das autoridades israelenses sobre a unidade das citadas organizações políticas palestinas deixam em evidência que Israel não tem qualquer interesse na paz na região e muito menos na criação do Estado Palestino. Fica claro que o objetivo do sionismo é ocupar todo o território palestino, através dos assentamentos ilegais, transformando o antigo território palestino no que chamam de Grande Israel, para inviabilizar na prática uma decisão da ONU, de 1948 - da coexistência pacífica de dois Estados, no território até então exclusivamente palestino -, boicotada pelos israelenses há mais de sessenta anos!

8 – Não tememos qualquer processo judicial, porque conhecemos as leis brasileiras, que têm como cláusula pétrea constitucional o livre direito de expressão e a proibição da censura.

9 – Mesmo que prosperasse esta absurda afronta às liberdades democráticas, estamos certos de que teríamos a solidariedade firme e militante de centenas de organizações políticas e sociais e personalidades democráticas, não só do Brasil, mas de todo o mundo.

10 – Não há, em qualquer documento do PCB, qualquer intolerância religiosa, étnica e racial contra qualquer povo ou comunidade. Criticar a direita sionista não significa criticar a comunidade judaica que, no Brasil e no mundo, é composta também por militantes democratas, humanistas e comunistas, que lutam contra a política terrorista e imperialista do Estado de Israel e se solidarizam com o povo palestino. O PCB tem uma vasta e orgulhosa tradição, desde a sua fundação até os dias de hoje, de contar com militantes e amigos de origem judaica.

11 - Os comunistas, em todo o mundo, somos contra qualquer intolerância religiosa ou étnica, contra preconceitos e nacionalismos xenófobos, porque lutamos por um mundo de iguais, sem fronteiras, sem Estado, sem forças armadas, sem opressores e oprimidos. Não entendemos o que a CONIB quer dizer com a expressão “intolerância racial”, pois todos os povos pertencem à mesma raça humana. A não ser que assim pensem os que se acreditam pertencentes a uma “raça superior”, escolhida por alguma divindade.

12 - Os comunistas do mundo inteiro tiveram papel decisivo na luta contra o nazi-fascismo que vitimou dramaticamente os judeus, mas também a muitos outros povos. O povo russo, dirigido pelo Partido Comunista da União Soviética, foi o que entregou mais vidas em defesa da humanidade, mais de 20 milhões, principalmente de seus jovens.

13 – O sítio do PCB na internet é um espaço de difusão não apenas das opiniões do Partido, mas de outras organizações e personalidades com alguma afinidade política, porque objetiva também prestar informação e fomentar o debate sobre questões candentes, nacionais e internacionais. Na primeira página de nosso portal (www.pcb.org.br), deixamos claro que:

Só publicamos nesta página textos que coadunam, no fundamental, com a linha política do PCB, a critério dos editores (Secretariado Nacional do CC). Quando não assinados por instâncias do CC, os textos publicados refletem a opinião dos autores”.

14 - Com o texto questionado pela central sionista brasileira temos uma identidade política, na medida em que ele denuncia a impunidade de Israel, os massacres que este Estado comete contra o povo palestino, o seu importante papel econômico e militar no contexto do imperialismo. Publicamo-lo como contribuição a um debate necessário, ainda que algumas opiniões ali expostas possam diferir, em alguns aspectos, de nossa análise marxista da luta de classes no âmbito mundial. Para nós, o sionismo não é o “Comitê Central” do imperialismo nem o único “dono do poder”, mas sócio e parte importante de sua engrenagem, uma significativa linha auxiliar com forte lobby internacional, enorme peso na mídia hegemômica, na economia mundial e na máquina de guerra imperialista.

15 – Sem preocupação com ameaças de qualquer tipo, estamos aqui oficialmente oferecendo à direção da Confederação Israelita do Brasil o direito de resposta, no mesmo espaço em que divulgamos o artigo criticado, para que a entidade possa se contrapor aos argumentos expostos pelo autor do texto “Os Donos do Sistema”. Como certamente o texto da CONIB será uma exceção ao nosso critério da afinidade política, nos reservaremos o direito de publicá-lo com comentários de nosso Partido.

16 – Este convite, além de democrático, atende à preocupação da CONIB, embora injustificada, de que sua finalidade, ao adotar a medida judicial, é “evitar que abusos e inverdades desencadeiem preconceitos contra a comunidade judaica brasileira”. Portanto, estejam à vontade para enviar ao nosso endereço eletrônico os seus pontos de vista.

17 – Esperamos também que a recíproca seja verdadeira, ou seja, que a CONIB publique em sua página a íntegra da presente nota política do PCB. Aproveitamos para sugerir que, no documento que nos mandarem, possamos conhecer suas posições em relação às Resoluções do último Congresso Nacional do PCB, a respeito do tema, e que transcrevemos aqui na íntegra:

XIV Congresso Nacional do PCB (outubro de 2009):

DECLARAÇÃO DE APOIO À CONSTRUÇÃO DO ESTADO PALESTINO DEMOCRÁTICO, POPULAR E LAICO, SOBRE O SOLO PÁTRIO HISTÓRICO:

1) Pelo fim imediato da ocupação israelense nos territórios tomados em 1967, fazendo valer o inalienável direito à autodeterminação do povo palestino sobre estes territórios;

2) Aplicação de todas as resoluções internacionais não acatadas pelo sionismo;

3) Garantia aos refugiados (atualmente, 65% da totalidade do povo palestino) de retorno às terras de onde foram expulsos (Resolução 194 da ONU);

4) Libertação imediata dos cerca de 11.000 prisioneiros, entre eles Ahmad Saadat, Secretário Geral da FPLP, e outros dirigentes da esquerda;

5) Reconstrução da OLP, ou seja, reconstrução da unidade política necessária às tarefas que estão colocadas para o bravo povo palestino, com garantia de participação democrática de todas as forças políticas representativas dos palestinos;

6) Apoio irrestrito a todas as formas de resistência do povo palestino;

7) Destruição do muro do apartheid, conforme resolução do Tribunal de Haia;

8) Demolição e retirada de todos os assentamentos judaicos na Cisjordânia/Jerusalém;

9) Fim imediato do bloqueio assassino a Gaza;

10) Pelo fomento de campanha internacional para levar os criminosos de guerra sionistas aos tribunais de justiça, dentre os quais, o Tribunal Internacional de Haia. 

11) Estabelecimento de sólida relação entre os partidos comunistas irmãos para concretizar ações de solidariedade e, em especial, apoio logístico à materialização desta luta;

12) Apoio a todas as iniciativas que visem estreitar laços entre os partidos da esquerda palestina, em especial a Frente Democrática pela Libertação da Palestina (FDLP), a Frente Popular de Libertação da Palestina (FPLP), Partido do Povo Palestino, em unidade concreta programática e de ação.

POR UM ESTADO PALESTINO DEMOCRÁTICO, POPULAR, LAICO, SOBRE O SOLO PÁTRIO HISTÓRICO! PELA TOTAL INDEPENDÊNCIA E AUTONOMIA DOS TERRITÓRIOS OCUPADOS EM 1967! PELO RETORNO DOS REFUGIADOS E JERUSALÉM CAPITAL! LIBERTAÇÃO DE TODOS OS 11.000 PRISIONEIROS PALESTINOS! PELA CONDENAÇÃO INTERNACIONAL DOS CRIMINOSOS DE GUERRA!

18 – Mas voltando ao artigo que gerou a representação, para que as críticas da CONIB se centrem na contestação às informações ali prestadas - ao invés de se esconderem sob o manto autoritário do carimbo “antissemita” -, sugerimos que releiam o texto, sem sectarismo nem preconceito. Verão que ele pode ter equívocos na forma de sua correta condenação ao Estado de Israel, mas não tem qualquer intolerância religiosa ou étnica.

19 – O texto, em nenhum momento, atinge o povo judeu, mas à sua liderança hegemônica - direitista, sionista e terrorista - deixando claro que nem todos os judeus concordam com seus métodos e que há vários intelectuais, organizações e militantes judeus que condenam e protestam contra o genocídio em Gaza e outras violências do Estado de Israel.

20 – Leiamos novamente algumas passagens do artigo de Manuel Freytas:

Israel não invadiu nem perpetrou um genocídio militar em Gaza com a religião judia, senão com aviões F-16, bombas de rácimo, helicópteros Apache, tanques, artilharia pesada, barcos, sistemas informatizados, e uma estratégia e um plano de extermínio militar em grande escala. Quem questione esse massacre é condenado por "anti-semita" pelo poder judeu mundial distribuído pelo mundo”.

O lobby sionista pró-israelense não reza nas sinagogas, senão na Catedral de Wall Street: um detalhe a ter em conta, para não confundir a religião com o mito e com o negócio”.

As campanhas de denúncia de antissemitismo com as quais Israel e organizações judias buscam neutralizar as críticas contra o massacre, abordam a questão como se o sionismo judeu (sustentáculo do Estado de Israel) fosse uma questão "racial" ou religiosa, e não um sistema de domínio imperial que abarca interativamente o plano econômico, político, social e cultural, superando a questão da raça ou das crenças religiosas”.

A esse poder (o lobby sionista internacional), e não ao Estado de Israel, é o que temem os presidentes, políticos, jornalistas e intelectuais que calam ou deformam diariamente os genocídios de Israel no Oriente Médio, temerosos de ficarem sepultados em vida, sob a lápide do "antissemitismo".

22 - Estejam certos de que não calarão nem sepultarão o PCB em vida, tarefa que não foi possível nem para as mais cruéis ditaduras de direita que marcaram a história do nosso país. Prenderam, exilaram, assassinaram, desapareceram com muitos comunistas, no Brasil e no mundo, por lutarem contra a opressão, pela autodeterminação dos povos, pelas liberdades democráticas e contra o nazi-fascismo.

Exigimos respeito!

Partido Comunista Brasileiro

Comissão Política Nacional

Maio de 2011

Observações:

1 – Este e outros artigos de Manuel Freytas são publicados, entre muitos outros, nos seguintes sítios:

http://www.resumenlatinoamericano.org/index.php?option=com_content&task=view&id=1966&Itemid=99999999&lang=es
http://www.aporrea.org/actualidad/n158685.html
http://colombia.indymedia.org/news/2010/06/115437.php
http://www.voltairenet.org/article165990.html#article165990
http://cafehistoria.ning.com/profiles/blogs/os-donos-do-sistema-este
http://port.pravda.ru/busines/14-06-2010/29887-impunidade_israel-0/
http://engforum.pravda.ru/index.php?/topic/210736-o-poder-oculto-de-onde-nasce-a-impunidade-de-israel/
http://www.rebelion.org/mostrar.php?tipo=5&id=Manuel%20Freytas&inicio=0 )
http://www.cubadebate.cu/noticias/2010/06/14/afirma-la-cruz-roja-que-el-bloqueo-israeli-es-ilegal/
http://visionesalternativas.com/index.php?option=com_deeppockets&task=contShow&id=95278&Itemid=
http://www.consulvenefunchal.com/index.php?option=com_content&task=view&id=2698&Itemid=64
http://alertaroja.net/index.php/alertaroja/2010/06/04/el-poder-oculto-de-donde-nace-la-impunid
http://xatoo.blogspot.com/2010/07/o-poder-oculto-de-onde-nasce-impunidade.html
http://www.senadoragloriainesramirez.org/index.php/2010/06/el-poder-oculto-de-donde-nace-la-impunidad-de-israel/
http://radiotrinchera.org/articulos/el-poder-oculto-de-donde-nace-la-impunidad-de-israel/rt/
http://www.tinku.org/content/view/504/6/
http://www.elciudadano.cl/2010/06/21/%C2%BFde-donde-nace-la-impunidad-de-israel/
http://www.atinachile.cl/content/view/851974/LA-INMUNIDIDAD-DE-ISRAEL-Y-EL-PREMIO-NOBEL.html
http://www.porpalestina.com/index.php?option=com_content&view=article&id=959:los-duenos-del-sistema&catid=16:artlos&Itemid=27
http://www.burbuja.info/inmobiliaria/temas-calientes/219139-vittorio-arrigoni-asesinado-por-la-mafia-sionista-3.html
http://www.infoeducasares.com.ar/?p=928
http://noticiaoficial.com/canales/aporrea/el-poder-oculto-de-donde-nace-la-impunidad-de-israel/
http://shiandalus.blogspot.com/2010/06/el-poder-oculto-de-donde-nace-la.html
http://bloguerosrevolucion.ning.com/profiles/blogs/el-poder-oculto-de-donde-nace?xg_source=activity
http://afrodescendientes.com/2010/07/03/el-poder-oculto-de-donde-nace-la-impunidad-de-israel-%E2%80%A8por-manuel-freytas/
http://estavoz.blogspot.com/2010/08/el-poder-oculto-de-donde-nace-la.html
http://chicodias.wordpress.com/2010/06/14/sionismo-um-poder-mundial/
http://neovisao.blogspot.com/2010/09/os-donos-do-sistema-o-poder-oculto-de.html
http://ingoldwetrustt.blogspot.com/2010/06/o-poder-oculto-de-onde-nasce-impunidade.html
http://agal-gz.org/blogues/index.php/canta/2010/06/13/os-donos-do-sistema-o-poder-oculto-de-onde-nasce-a-impunidade-de-israel-1
http://anjaoudemonia.blogspot.com/2010/09/os-homens-por-tras-das-cortinas.html

2 - Segundo levantamento feito pela Federação Árabe-Palestina, apenas em 2011, a CIA destinou 120 milhões de dólares, para financiar o sistema de difamação da religião islâmica no Brasil. 

3 – O mesmo texto usado pelo sionismo contra o PCB é usado como pretexto para o mesmo tipo de ação intimidatória na Venezuela, num relatório denominado “Antisemitismo en Venezuela”, de autoria de uma organização à qual a CONIB é ligada, chamada ADL (Anti-Defamation League), que em português significa Liga contra a Difamação. Apesar do nome genérico da entidade, ela só criminaliza e intimida o que considera difamação “anti-semita”. Veja a página 16 do sítio http://www.adl.org.

4 – neste momento, Israel está usando os céus da Grécia, por autorização do governo local, para treinar seus pilotos e testar seus aviões militares para um possível ataque ao Irã, cuja topografia tem características semelhantes às do país helênico.

5 – nos próximos dias, estaremos publicando aqui nesta página vários textos de judeus progressistas e comunistas, inclusive israelenses, contra o sionismo e a utilização do carimbo “antissemitismo” como forma de censurar denúncias contra o Estado de Israel.
WikiLeaks do golpe de 64

WikiLeaks do golpe de 64

imagemCrédito: Vi o mundo


Luiz Carlos Azenha

Este é o WikiLeaks do golpe de 1964, que devemos ao The National Security Archive. Tradução de telegrama de 27.03.1964, do então embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Lincoln Gordon, a superiores em Washington:

TOP SECRET

Pessoal do embaixador Gordon. Favor passar imediatamente para o secretário de Estado Rusk, o secretário-assistente Mann, Ralph Burton, secretário de Defesa McNamara, secretário-assistente de Defesa McNaughton, general Maxwell Taylor, diretor da CIA John McCone, coronel J.C. King, Desmond Fitzgerald, na Casa Branca para Bundy e Dungan, passar na zona do Canal (onde ficava o Comando Militar Sul dos Estados Unidos) ao general O’Meara. Outra distribuição só com aprovação dos acima citados.

1. Desde que retornei ao Rio em 22 de março eu tenho estudado a situação brasileira profundamente com assessores civis e militares daqui, convocando os chefes de missão em São Paulo e Brasília para ajudar e fazendo alguns contatos com brasileiros bem informados.

2. Minha conclusão é de que Goulart está definitivamente engajado em uma campanha para assumir poderes ditatoriais, aceitando a colaboração do Partido Comunista Brasileiro e outros grupos revolucionários da esquerda para esse fim. Se ele for bem sucedido é mais do que provável que o Brasil caia sob controle completo dos comunistas, ainda que Goulart possa ter a esperança de se voltar contra os apoiadores comunistas e adotar um modelo peronista, o que pessoalmente acredito que ele prefere.

3. As táticas imediatas da guarda palaciana de Goulart estão concentradas em pressões para garantir no Congresso reformas constitucionais inalcançáveis por meios normais, usando uma combinação de manifestações nas ruas, ameaças de greve ou greve, violência rural esporádica e abuso do enorme poder financeiro discricionário do governo federal. Isso vem junto com uma série de decretos executivos populistas, de legalidade qüestionável, e uma inspirada campanha de rumores sobre outros decretos, calculada para amedrontar elementos da resistência. Especialmente importante nessa conexão é a habilidade do presidente de enfraquecer a resistência no nível estadual ao segurar financiamento federal essencial. O governo também tem submetido emissoras de rádio e TV à censura parcial, aumentado o uso da agência de notícias nacional e requisitado tempo para transmitir propaganda reformista, fazendo ameaças veladas contra a imprensa de oposição. O propósito não é só de assegurar reformas econômicas e sociais construtivas, mas desacreditar a atual Constituição e o Congresso, assentando as bases para um golpe de cima para baixo que pode ser ratificado por um plebiscito fraudado e a reescrita da Constituição por uma Assembléia Constituinte fraudada.

4. Eu não descarto inteiramente a hipótese de que Goulart seja amedrontado a desistir dessa campanha e que termine normalmente seu mandato (até 31 de janeiro de 1966), com eleições presidenciais sendo realizadas em outubro de 1965. Essa seria a melhor saída para o Brasil e para os Estados Unidos, se acontecer. Os compromissos de Goulart com a esquerda revolucionária são agora tão profundos, no entanto, que as chances de alcançar esse resultado através da normalidade constitucional parecem ser de menos de 50%. Ele pode fazer recuos táticos para tranquilizar a oposição novamente, como fez no passado. Há alguns sinais de que isso aconteceu nos últimos dias, como resultado da maciça manifestação da oposição nas ruas de São Paulo no dia 19 de março, a hostilidade declarada de governadores de estados importantes e ameaças e descontentamento de oficiais, especialmente do Exército. Mas a experiência passada mostra que cada recuo tático permite ganho considerável de espaço e o próximo avanço vai além do anterior. Com o tempo do mandato acabando e os candidatos à sucessão entrando ativamente em campo, Goulart está sob pressão para agir mais rapidamente e com menor cálculo dos riscos. O desgoverno também acelera a taxa de inflação a ponto de ameaçar a quebra da economia e a desordem social. Um salto desesperado por poder ditatorial pode acontecer a qualquer momento.

5. O movimento Goulart, incluindo seus afiliados comunistas, representa a minoria – não mais de 15 a 20 por cento do povo ou do Congresso. Sistematicamente assumiu o controle de muitos pontos estatégicos, notavelmente na Petrobras (que sob um decreto de 13 de março agora assumirá as cinco últimas refinarias privadas ainda não sob seu controle), no Departamento de Correios e Telégrafos, na liderança de sindicatos do petróleo, das rodovias, dos portos, da marinha mercante, das recém-formadas associações de trabalhadores rurais e de algumas outras indústrias-chave, a Casa Civil e Militar da Presidência, unidades importantes dos ministérios da Justiça e Educação e elementos de muitas outras agências de governo. Nas Forças Armadas, há um grande número de oficiais esquerdistas que receberam privilégicos e posições-chave de Goulart, mas a grande maioria é de legalistas e anti-comunistas e há um antigo grupo de apoiadores de um golpe na direita. A esquerda tem tentado enfraquecer as Forças Armadas através da organização subversiva de oficiais da reserva e de pessoal alistado, com resultados significativos especialmente na Força Aérea e na Marinha.

6. No dia 21 de março eu tive uma conversa com o secretário (de Estado) Rusk para avaliar a força e o espírito das forças de resistência e as circunstâncias que podem causar violência interna e um confronto. Acredito que desde o comício de Goulart com os sindicalistas no Rio, em 13 de março (o comício da Central do Brasil) houve uma polarização de atitudes, com apoio à Constituição e ao Congresso, para reformas apenas dentro da Constituição e a rejeição do comunismo, que vem de um grupo de governadores: Lacerda da Guanabara, Adhemar de Barros de São Paulo, Meneghetti do Rio Grande do Sul, Braga do Paraná e, para minha surpresa, Magalhães Pinto, de Minas Gerais. Eles foram fortalecidos pela clara declaração do ex-presidente marechal Dutra e pelo discurso de Kubistchek em sua indicação como candidato (à presidência). O grande comício pró-democracia em São Paulo, no dia 19 de março, organizado principalmente por movimentos de mulheres, deu um importante elemento de demonstração de massa pública, com reações favoráveis no Congresso e nas Forças Armadas.

7. Existe uma interdependência recíproca de ação entre o Congresso e as Forças Armadas. A resistência do Congresso a ações ilegais do Executivo e às exigências abusivas para mudança constitucional do presidente depende da convicção dos congressistas de que eles terão cobertura dos militares se assumirem posição. A tradição legalista das Forças Armadas é tão forte que elas desejariam, se possível, cobertura do Congresso para qualquer ação contra Goulart. A ação do Congresso é uma chave importantíssima da situação.

8. Enquanto uma clara maioria do Congresso desconfia das propostas de Goulart e despreza a sua evidente incompetência, o consenso presente dos líderes congressistas anti-Goulart é de que a maioria absoluta da Câmara dos Deputados não será obtida para um impeachment. Eles também se opõem à mudança do Congresso de Brasília acreditando que isso diminui o prestígio já abalado, embora mantenham aberta a possibilidade de um recuo dramático para São Paulo ou outro lugar como último recurso no caso de se aproximar uma guerra civil ou de uma guerra civil em andamento. Eles agora focam a aprovação de algumas reformas amenas como forma de enfrentar a campanha de Goulart contra o Congresso e avaliam outras maneiras de mostrar resistência ativa. Há pequena possibilidade de aprovação de uma lei de plebiscito, delegação de poderes (ao presidente), legalização do Partido Comunista, direito de voto para os analfabetos ou outras mudanças buscadas por Goulart.

9. De toda forma, a mudança mais significativa é a cristalização de um grupo de resistência militar sob a liderança do general Humberto Castello Branco, chefe de estado-maior do Exército. Castello Branco é um oficial altamente competente, discreto, honesto e respeitado, que tem forte lealdade aos princípios legais e constitucionais e até recentemente evitava qualquer aproximação com conspiradores anti-Goulart. Ele se associou com um grupo de outros oficiais bem colocados e está assumindo agora o controle e a direção sistemática de uma ampla mas ainda descentralizada organização de resistência de grupos militares e civis em todas as partes do país.

10. A preferência de Castello Branco seria de agir somente em caso de provocação inconstitucional óbvia, isso é, uma tentativa de Goulart de fechar o Congresso ou intervenção em um dos estados da oposição (Guanabara ou São Paulo sendo os mais prováveis). Ele reconhece, no entanto (e eu também) que Goulart pode evitar uma provocação óbvia, enquanto continua a se mover em direção a um fait accompli irreversível através de greves manipuladas, enfraquecimento financeiro de estados ou um plebiscito – incluindo voto para os analfabetos – para dar apoio a um tipo de poder bonapartista ou gaulista. Castello Branco está se preparando, portanto, para um possível movimento no caso de uma greve geral comandada pelos comunistas, outra rebelião dos sargentos, a convocação de um plebiscito que enfrente oposição do Congresso ou mesmo alguma grande medida governamental contra líderes democráticos militares ou civis. Neste caso, a cobertura política deve vir em primeira instância de um grupo de governadores, declarando-se o legítimo governo do Brasil, com apoio do Congresso em seguida (se o Congresso ainda puder agir). Também é possível que Goulart renuncie sob pressão de sólida oposição militar, ou para “fugir” do país ou para liderar um movimento “populista” revolucionário. As possibilidades claramente incluem guerra civil, com alguma divisão horizontal ou vertical nas Forças Armadas, agravadas pela posse disseminada de armas nas mãos de civis dos dois lados.

11. Ao contrário dos vários grupos anti-Goulart que nos procuraram durante os últimos dois anos e meio, o movimento de Castelo Branco demonstra a perspectiva de apoio amplo e liderança competente. Se nossa influência for usada para evitar um grande desastre aqui – o que pode transformar o Brasil na China dos anos 60 – nesse grupo é que tanto eu quanto meus assessores acreditamos que nosso apoio deve ser colocado (os secretários Rusk e Mann devem notar que Alberto Byington* está trabalhando com esse grupo). Nós temos essa visão mesmo que Castello Branco seja afastado de sua posição no Exército.

* Alberto Byington era um industrial paulista que ajudou a articular o golpe

12. Apesar de sua força entre os oficiais, o grupo de resistência está preocupado com as armas e a possível sabotagem do abastecimento de combustível. Dentro da próxima semana vamos avaliar as estimativas das armas necessárias através de um contato com o general Cintra*, o braço direito do Castello Branco. As necessidades de combustível incluem combustível para a Marinha, que agora está sendo buscado por Byington, além de gasolina para motores e para a aviação.

* General Ulhoa Cintra

13. Dada a absoluta incerteza quanto ao timing de um possível incidente-gatilho (que poderia ocorrer amanhã ou a qualquer momento), recomendamos (a) que sejam tomadas medidas o mais rapidamente possível para preparar uma entrega clandestina de armas que não sejam de origem americana a apoiadores de Castello Branco em São Paulo, assim que as necessidades sejam definidas e os arranjos feitos. A melhor possibilidade de entrega parece ser em um submarino sem identificação a ser descarregado à noite em algum ponto isolado da costa do estado de São Paulo, ao sul de Santos, provavelmente perto ou em Iguape ou Gananeia (Cananéia); (b) isso deveria ser acompanhado por combustível (a granel, embalado ou ambos), também evitando a identificação do governo dos Estados Unidos, com entrega que espere o início ativo de hostilidades. A ação (DEPTEL 1281*) deve proceder.

*Telegrama enviado à Embaixada desde Washington: “Defesa (o Departamento de) providenciou a lista dos materiais solicitados e outras informações sobre o navio-tanque de petróleo discutidas com você. Urgentemente esperando sua avaliação da situação para dar os passos seguintes nesta ação e definir próximos passos vis-à-vis Brasil.”

14. O atendimento às sugestões acima pode ser suficiente para assegurar a vitória de forças amigáveis sem qualquer participação aberta, logística ou militar, dos Estados Unidos, especialmente se politicamente nossa intenção é dar reconhecimento imediato ao novo governo do Brasil. Deveríamos nos preparar sem demora para a contingência de uma intervenção aberta em um segundo estágio e também contra a possibilidade de ação soviética para apoiar o lado dos comunistas. Para minimizar as possibilidades de uma guerra civil prolongada e assegurar a adesão de um grande número de “band-wagon jumpers” (os que ficam em cima do muro), nossa habilidade em demonstrar compromisso e algum tipo de demonstração de força com grande rapidez pode ser crucial. Com esse objetivo e conforme nossas conversas em Washington, no dia 21 de março, uma possibilidade parece ser o envio de uma força-tarefa naval para manobras no Atlântico Sul, a poucos dias de distância de Santos. A logística deve seguir as especificações do South Brazil Contingency Plan (USSCJTFP-BRAZIL*), revisado aqui em 9 de março. Um porta-aviões seria muito importante pelo efeito psicológico. O contingente de fuzileiros navais poderia cumprir tarefas de performance logística definidas no South Plan. Instruções são aguardadas nesse ou em métodos alternativos, desde que com os objetivos acima mencionados.

* Planos de contingência militar que o Pentágono mantém em relação a todas as regiões do mundo, que passam por revisões constantes

15. Nós reconhecemos o problema de incerteza quanto ao período da necessidade dessas forças na área. Com crises quase diárias de intensidade variável aqui, no entanto, e a violência a ponto de se tornar epidêmica através de invasões de terra, confrontos entre grupos comunistas e democráticos nas ruas e com o crescendo das ações de Goulart com o objetivo de “atingir as reformas-de-base” até 24 de agosto (décimo aniversário do suicídio de Vargas), perigo real existe da irupção de guerra civil a qualquer momento. O único sinal convincente (em contrário) seria uma limpeza dos extremistas da guarda civil e militar do grupo palaciano. O episódio atual dos marinheiros rebeldes demonstra a fragilidade da situação e possível iminência de um confronto.

16. Estamos, enquanto isso, tomando medidas complementares com nossos recursos para fortalecer as forças da resistência. Isso inclui apoio clandestino a manifestações de rua pró-democracia (o próximo grande evento será no dia 2 de abril, no Rio, com outros ainda sendo programados), a difusão discreta de que o governo dos Estados Unidos está profundamente preocupado com os acontecimentos e o encorajamento de sentimento democrático e anti-comunista no Congresso, nas Forças Armadas, grupos amigáveis de estudantes e sindicalistas, igreja e empresas. Poderemos requisitar modestos fundos suplementares para outros projetos de ações clandestinas em futuro próximo.

17. Também acredito que seria útil, sem entrar em detalhes, uma resposta em entrevista coletiva do secretário de Estado ou do presidente indicando preocupação com informações sobre a deterioração econômica e a inquietude política no Brasil e a importância para o futuro do Hemisfério de que o Brasil, comprometido com suas raízes democráticas e tradições constitucionais, vai continuar seu progresso social e econômico sob a democracia representativa. Recomendamos que isso seja feito nos próximos dias.

18. Essa mensagem não é alarmista ou reação apavorada a um único incidente. Reflete as conclusões conjuntas da equipe da embaixada baseadas em uma longa corrente de ações e informação de inteligência que nos convenceram de que existe um perigo real e presente para a democracia e a liberdade no Brasil, que poderia conduzir esta nação enorme ao campo comunista. Se este fosse um país de menos importância estratégica para os Estados Unidos – tanto diretamente quanto no impacto que tem na América Latina – poderíamos sugerir um período de acompanhamento esperando que a resistência brasileira, sem ajuda, cuidasse do problema. Nós acreditamos que há uma grande possibilidade de que ela consiga fazer isso, dados os sentimentos básicos e as atitudes da maioria das pessoas e a força da democracia organizada, especialmente na metade Sul do país. O poder de Goulart e da presidência de enfraquecer e abalar a resistência é tão grande, no entanto, que nosso apoio manifesto, tanto moral quanto material e até a um custo substancial, pode ser essencial para manter a coluna da resistência brasileira. Não podemos perder tempo nos preparativos para tal ação. A alternativa de arriscar um Brasil comunista parece inaceitável, causando custos potencialmente muito maiores tanto em dinheiro quanto em vidas.”

Este e outros documentos em inglês sobre o golpe de 1964 estão aqui.

Publicado no Viomundo antigo, originalmente em 17 de dezembro de 2007

Fonte: http://www.viomundo.com.br/denuncias/wikileaks-do-golpe-de-64.html