A recente visita fraterna que me permitiu conviver três inesquecíveis dias com os comunistas peruanos marca o reencontro dos nossos Partidos, a retomada de uma amizade cujas raízes remontam a décadas de convivência fraterna e leal no movimento comunista internacional, desde a inspiração da Revolução Russa.
A intensa agenda preparada pelos camaradas permitiu-me, apesar do pouco tempo, testemunhar que o Partido de Mariátegui, fundado por ele e outros camaradas em 1928, reforça seu papel de vanguarda junto ao povo peruano, na luta pelo socialismo.
Sinto a necessidade de tentar passar para a militância e os amigos do meu Partido todo o aprendizado que tive entre vocês. Desde a importante reunião com a Comissão Política do PCP, no primeiro dia, pude sentir o carinho com que os camaradas recebiam o PCB.
Na proveitosa troca de informes, quando passamos em revista nossos pontos de vista sobre a conjuntura mundial, enfatizando nosso continente e nossos próprios países, falando francamente das nossas possibilidades e dificuldades, sentimo-nos militantes de um mesmo Partido, atuando em espaços diferentes. Pudemos constatar as convergências de nossas opiniões, sobretudo sobre o caráter marxista-leninista do Partido e - respeitadas algumas diferenças das realidades nacionais - os caminhos para a revolução socialista.
Coincidimos que a crise do capitalismo coloca a luta de classe num patamar superior em âmbito mundial; na centralidade do trabalho; na necessidade de ruptura do capitalismo; na importância de politizar os movimentos sociais; na atualidade do Partido Comunista; no internacionalismo proletário e na imperiosa urgência de amarrarmos com laços mais fortes as relações entre os Partidos irmãos de outros países, em especial da América Latina.
Conheci um pouco da saga do heróico Partido Comunista Peruano. Aprendi muito na gentil acolhida que me concedeu o camarada Mario Huamán, Secretário Geral da mais forte, classista e ampla central sindical peruana de todos os tempos, talvez a mais importante da América do Sul, a CGTP (Confederação Geral dos Trabalhadores Peruanos), que tive a oportunidade de conhecer em 1983, a caminho de nossa querida Cuba, para o X Congresso Mundial da FSM (Federação Sindical Mundial). O camarada Mário ouviu preocupado meu informe de que o sindicalismo classista no Brasil está muito fragmentado, animando-se apenas quando lhe disse que retomamos aos poucos algumas ações unitárias, em função dos efeitos da crise do capitalismo, para que não recaiam nas costas dos trabalhadores. Foi alvissareiro seu informe sobre a CGTP, que representa hoje mais de 80% dos trabalhadores sindicalizados no país.
Apesar de o Peru ser um dos dois únicos países da América do Sul, ao lado da Colômbia, dirigidos por governos de direita, alinhados incondicionalmente ao imperialismo norte-americano (com o qual mantêm Tratados de Livre Comércio), creio que recebi melhores notícias do que transmiti, do ponto de vista das condições para a luta pelo socialismo. Refiro-me, por exemplo, à existência de um respeitado jornal diário de esquerda (La Primera), que circula em todo o território nacional, ininterruptamente, há quatro anos. Os camaradas ficaram incrédulos quando lhes assegurei que no Brasil não existe nenhum jornal diário de esquerda, apesar de quase seis anos de um governo proclamado progressista. Aliás, em nenhum outro país da América do Sul tive tanta dificuldade para explicar que o PCB se coloca em oposição ao governo Lula; confrontado com o direitista Allan Garcia, parece um governo de esquerda. Pelo que percebi, foi a primeira vez que a esquerda peruana teve contato direto com um contraponto à opinião dos partidos que sustentam o governo Lula, que por lá passam contando fantasiosos feitos progressistas do nosso Presidente. A entrevista que concedi ao "La Primera", publicada na edição deste domingo, certamente também contribuirá para esclarecer o que lá muitos não imaginavam: a existência de uma oposição de esquerda ao governo brasileiro.
Cito ainda, com uma ponta de nostalgia, a unidade cada vez maior entre os quatro principais partidos políticos da esquerda peruana: Partido Comunista Peruano, Partido Socialista, Partido Comunista do Peru e Partido Nacionalista, liderado por Ollanta Humala, que foi o candidato desta frente a Presidente da República na última eleição (e deverá sê-lo na próxima, em 2011) e que tem afinidade com o pensamento de Hugo Chávez.
Mas o que mais me impressionou positivamente foi uma rica e exitosa experiência de unidade de ação de toda a esquerda peruana, juntando numa frente única todas as organizações políticas e sociais. Chama-se CPS (Coordenadora Política e Social). Corresponde exatamente a uma proposta que o PCB vem levantando no Brasil desde 2006. Não se trata de uma coligação eleitoral, mas de uma frente anticapitalista, permanente, com programa mínimo, voltada para a unidade de ação, englobando organizações políticas (não apenas partidos registrados) e os movimentos sociais, com decisões tiradas por consenso. A unidade entre organizações políticas e sociais, no mesmo espaço, contribui para a politização dos movimentos sociais, limitados por sua natureza, e potencializa nossa capacidade de ação no movimento de massas.
Tive a oportunidade de participar de um grande encontro com a Comissão Nacional da CPS, reunida especialmente para receber-me, como Secretário Geral do PCB, para trocarmos pontos de vista e informes e criarmos um ambiente favorável a iniciativas comuns. Participam da CPS a Confederação Geral de Trabalhadores do Peru (CGTP), a Central Única de Trabalhadores (CUT, ligada ao PS), Confederação Nacional Agrária (CNA), Confederação Campesina do Peru (CCP); movimentos sociais e indigenistas; Federação de Estudantes do Peru (FEP); Frente Popular; Frentes e Coordenadoras Regionais (de Arequipa, Cuzco, Ica etc.); Partido Nacionalista Peruano (PNP), Partido Comunista Peruano (PCP), Partido Socialista (PS), Partido Comunista do Peru (Patria Roja), Partido Socialista Revolucionário (PSR), Frente Obreira, Campesina e Estudantil do Peru (FOCEP), Voz Socialista e FEDEP.
A CPS tem realizado várias jornadas de luta, como as greves gerais e regionais de 2007 e 2008, um expressivo Primeiro de Maio unificado este ano. A próxima ação será um Dia Nacional de Lutas, agora no dia 27 de maio, conjugando greves, manifestações e várias formas de protesto.
Mas a emoção maior os camaradas reservaram para a última noite da programação: um caloroso ato público de homenagem ao PCB, na sede nacional do PCP, que se engalanou para nos receber e a mais de cem camaradas, dirigentes e militantes comunistas de Lima, Callao e outros municípios próximos. Confesso que a emoção e a responsabilidade me pesaram muito, quando se fez um silêncio profundo e respeitoso, logo após o camarada Roberto de la Cruz, Secretário Geral do PCP, me pedir que falasse, sem tempo estabelecido, sobre a história, o presente e os projetos e possibilidades do PCB para o futuro. Sem que qualquer camarada se retirasse, passaram-se quase duas horas até a singela confraternização de encerramento.
Espero que tenha podido retribuir, pelo menos em parte, apesar do "portunhol" limitado, todo o aprendizado que os comunistas peruanos me proporcionaram neste curso intensivo sobre a história e a realidade da luta de classe no Peru.
Tive o privilégio de ter convivido com os camaradas Roberto de la Cruz, Renán Raffo, Vladimiro del Prado, Manolo, Emilio, Oscar Alarcón, a camarada Paty (Secretária Geral da JCP - Juventude Comunista Peruana) e tantos camaradas do PCP e de outras organizações revolucionárias, que também me ajudaram a compreender um pouco o Peru e a valorizar a unidade. Apenas como exemplo, talvez por empatia, quero citar os camaradas César Levano, Diretor de La Primera, Genaro Ledesma, da FOCEP, e Tany Valer Lopera, do Partido Comunista do Peru, fundado em 1964, em razão das mesmas divergências sino-soviéticas que levaram, em 1962, à divisão do PCB, com a criação do PCdoB. Tive a oportunidade de manter com Tany um fraterno diálogo sobre algumas questões do movimento comunista. Na América do Sul, só no Brasil e no Peru se mantiveram dois partidos com as mesmas origens históricas.
Mas não posso deixar de destacar que o camarada Raul Nuñez, da Secretaria de Relações Internacionais do PCP, se excedeu em generosidade, acompanhando-me sempre bem disposto em todas as atividades da agenda. Durante a reunião com a CPS senti sua falta: retirou-se e voltou discretamente uma hora depois. Só quando se encerrou o ato na sede do PCP que descobri o motivo da saída, quando, fazendo a saudação de encerramento, ele me entregou de público lembranças da arte popular peruana. Durante os dois dias anteriores, andando apressados e conversando pelas ruas de Lima, entre um compromisso e outro, Raul, com sua sensibilidade, percebera o que mais me encantou em seu fantástico país, de ricas tradições culturais.
Em nome da militância do PCB, e certamente da UJC, reitero que este reencontro - amadurecido pela emergência de nossos Partidos e pela atualidade da luta pelo socialismo - sela um compromisso político e ideológico de longo curso, cimentado pelo internacionalismo proletário.
Estejam certos os camaradas do PCP que os esperamos no XIV Congresso do nosso Partido, em outubro deste ano, com o mesmo calor solidário com que receberam o PCB neste país irmão.
VIVA A AMIZADE FRATERNA E ETERNA ENTRE O PCP E O PCB.
Rio de Janeiro, 11 de maio de 2009
Ivan Pinheiro
Secretário Geral do PCB
Internacionalismo proletário: Aos camaradas do Partido Comunista Peruano - Ivan Pinheiro
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Kaizim