14 de janeiro de 2014

MST considera 2013 o pior ano para a reforma agrária

andes.org.br
Dirigentes do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) realizam balanço das políticas agrária e agrícola do governo federal do ano passado e afirmam que “2013 foi o pior ano para a reforma agrária”. João Paulo Rodrigues, um dos coordenadores do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), assegura que quase nada foi feito e, mais grave ainda, denuncia o fato de que, em muitos casos, o governo retroagiu. “2013 é um ano que não deixará saudades nos sem-terra de todo o país”, declara o dirigente.
Ele diz que “o governo Dilma, que sempre esteve péssimo nessa questão, conseguiu piorar ainda mais. Até agora, só 159 famílias foram assentadas em todo o país. É uma vergonha. Não passam de 10 os imóveis desapropriados por este governo. Pior que o último governo militar do general Figueiredo, quando foram desapropriados 152 imóveis”, compara.
Alerta para um problema considerado grave pelo movimento, o qual o governo federal está chamando de “emancipação dos assentamentos”, ou seja, passando o título dos lotes para os assentados. “Na prática, isso serve para o Estado deixar de ter responsabilidade sobre as famílias. Mas o pior é que essa política vai criar uma contrarreforma agrária, uma vez que grandes fazendeiros vão passar a pressionar os assentados para que vendam seus lotes, pondo tudo por água abaixo e aumentando ainda mais a concentração das terras no país”, denuncia.
Bancada ruralista, commodities e superávit primário
O dirigente do MST afirma que há várias dificuldades que impedem o avanço da reforma agrária, mas, para ele, há dois grandes problemas cruciais. O primeiro é o fato de o governo estar completamente refém da bancada ruralista, a maior frente parlamentar do Congresso Nacional. São 162 deputados e 11 senadores, e mais uma legião de adeptos de última hora. “Só para se ter a dimensão do problema, por mais absurda que seja a pauta desse setor, eles conseguem sair vitoriosos em todas, mesmo em propostas inconstitucionais”.
“Podemos pegar desde o estrangulamento do Código Florestal, passando pela alteração da PEC do Trabalho Escravo, o retrocesso sobre a legislação referente à demarcação de terras indígenas, a criação de uma comissão especial para liberar com maior facilidade novos agrotóxicos – ignorando o trabalho de avaliação da Anvisa e do Ibama – e a liberação de novas sementes transgênicas. Nenhuma dessas propostas é de interesse da sociedade brasileira. Todas são exclusivamente dos interesses particulares desse setor e estão sendo vitoriosas. A bancada ruralista é um câncer no povo brasileiro”, avalia.
O outro tema considerado problema crucial pelos sem-terra é a relação do governo com o agronegócio. “As grandes exportações de commodities promovidas por esse setor permitem ao governo a manutenção da política de geração sistemática de superávit primário, garantindo o destino de recursos orçamentários para o setor financeiro, como o pagamento de juros e serviços da dívida pública, o que é lamentável”.
Políticas públicas não satisfazem às necessidades
Rodrigues cita algumas conquistas no campo das políticas públicas como resultantes das lutas dos movimentos sociais, mas afirma que elas têm limite. “Lutamos e garantimos no âmbito das políticas públicas a compra de alimentos, a educação no campo, a agroindustrialização da nossa produção, a introdução de outro modelo de agricultura, no entanto, temos em mente que embora essas medidas sejam importantes, elas têm seus limites. São muito desproporcionais se comparadas com os investimentos destinados ao agronegócio.
Um exemplo disso é o Plano Safra 2013-2014 da Agricultura Familiar que representa pouco mais de 20% do que é destinado ao agronegócio”, compara. E completa: “Além disso, contamos com essas políticas públicas hoje, mas nada nos garante que poderemos contar com elas amanhã, se houver troca de governantes”, avisa.
Apesar de ter sido um ano negativo em relação à reforma agrária, Rodrigues considera que o ano foi positivo para a luta dos camponeses. “Montamos um acampamento permanente em Brasília durante três meses, realizamos várias lutas na capital federal, como marchas, ocupações de ministérios e atos políticos”, contabiliza.
A lógica e a estrutura da produção agrícola
Ele sugere que, para resolver os problemas e mudar a lógica e a estrutura da produção agrícola do Brasil, é preciso priorizar a produção camponesa e familiar e não tratá-las como algo secundário, e que o governo precisa entender que a única solução à pobreza é uma ampla reforma agrária, criando milhares de empregos no campo. “A própria FAO reconheceu que a única saída à crise ambiental e a garantia da soberania alimentar está na agricultura familiar. Tanto é que 2014 será o Ano Internacional da Agricultura Familiar pela ONU”.
Ele explica que não há como conciliar os dois modelos de produção agrícola porque eles se contrapõem em sua lógica e essência. “A ganância do agronegócio junto aos seus gigantescos recursos econômicos inviabiliza outro tipo de agricultura, pois sempre buscarão incorporar as terras dos camponeses e os recursos naturais a seu modelo de produção de commodities. Nas duas últimas décadas mais de 6 milhões de pessoas foram expulsas pelo agronegócio no campo brasileiro. E foram para as favelas dos grandes centros urbanos. O agronegócio não gera emprego, mais de 70% da mão de obra empregada no campo é da agricultura familiar, e se apropria das pequenas e médias propriedades, uma vez que a concentração de terras no Brasil segue aumentando ano a ano”.
Ele informa ainda que, no âmbito da produção de alimentos básicos, a situação do Brasil é também considerada gravíssima. “De 1990 a 2011, as áreas plantadas com alimentos básicos, como arroz, feijão, mandioca e trigo, declinaram entre 20% e 35%, enquanto os produtos nobres do agronegócio, como a cana de açúcar e a soja, aumentaram 122% e 107%. E tudo voltado à exportação. Estamos tendo de importar até arroz e feijão da China. Isso é alarmante”, alerta.
Em levantamento comparativo sobre os dois modelos, o MST demonstra, com base nas informações do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),  que o discurso de que o agronegócio é o modelo responsável por alimentar o país e empregar a força de trabalho camponesa cai por terra quando se olha os dados do meio rural brasileiro.
Segundo o Censo Rural do IBGE, a maior parte da produção para alimentação do povo brasileiro (70%) e emprego dos trabalhadores está na agricultura familiar, mesmo esta tendo menos crédito e poucas terras. O agronegócio, por sua vez, concentra terras, recebe mais créditos e produz apenas 30% do que é consumido pela população. O resto da produção, em sua maioria commodities, é exportado.
VI Congresso Nacional
Em fevereiro o MST vai realizar o seu 6° Congresso Nacional e nele, segundo Rodrigues, irá consolidar a proposta sobre a Reforma Agrária Popular. “Mais do que nunca a Reforma Agrária é urgente e necessária. No entanto, é uma Reforma Agrária de novo tipo, o que chamamos de Popular. Entendemos que a Reforma Agrária não é mais uma política voltada apenas para a população o do campo. Ela é urgente e necessária para o conjunto da sociedade como um todo”.
Em julho do ano passado, depois de analisar os resultados das ações do governo pela reforma agrária e a luta do MST, João Pedro Stédile, uma das lideranças do movimento, disse que aposta numa nova forma de luta para se conquistar a reforma agrária. Para ele, essa nova luta têm de ser por território e precisa incluir novas bandeiras, como direitos indígenas, desmatamento, trabalho escravo e impactos da mineração.
*Gráfico: Site do MST

Postagens relacionadas

MST considera 2013 o pior ano para a reforma agrária
4/ 5
Oleh

Assine via e-mail

Por favor inscreva-se para receber as ultimas postagens no e-mail.