O Brasil e o mundo acompanham os acontecimentos da região metropolitana do Rio de Janeiro – castigada por chuvas torrenciais que já vitimaram cerca de 300 pessoas.
Os governantes e a mídia e a maioria dos especialistas concentraram suas argumentações – para explicar o número tão elevado de mortes e o caos instalado na região – em três frentes: a quantidade de chuva superou em muito a média histórica para o período de tempo; a “geografia” do Rio de Janeiro é vulnerável a esse tipo de tragédia; a população é a maior responsável pelas mortes por viver em encostas cujo solo não é propício à construção de moradias.
Trata-se de um festival de dissimulação e de desrespeito às vítimas, que serve para não expor o sistema capitalista e preservar governos e para justificar tragédias semelhantes que venham a ocorrer no futuro e responsabilizar a pobreza.
O modelo de produção e consumo capitalista está levando o planeta à exaustão, e a natureza vem anunciando, nos últimos anos, que acontecimentos como esses podem ser cada vez mais frequentes. É mais que nítida a necessidade de mudar tais padrões, e sabemos que isso não ocorrerá sem uma transformação profunda da sociedade.
As cidades refletem diretamente os efeitos do padrão de desenvolvimento capitalista, seja no transporte dominado pelos automóveis e por oligopólios de empresas de ônibus (como no caso do Rio de Janeiro, onde exercem forte influência política e impedem, na prática, a implantação ou expansão de transportes sobre trilhos e aquaviário), seja na ocupação hierarquizada do solo urbano, seja na oferta de infraestrutura e de serviços sociais (estes explorados, em grande parte, por empresas privadas, como no caso da saúde, o que gera a sua concentração nas áreas de alta renda e a ausência de ações preventivas).
É para as cidades que vêm os que deixam o campo, em busca de emprego, saúde, educação. Para a moradia, dada a ocupação das áreas centrais e mais nobres pelas camadas de alta renda, restam-lhes as áreas distantes do centro – desprovidas de oferta de transporte público a baixo custo – ou as encostas e as margens dos rios, locais onde, em muitos casos, não há condições técnicas para a estabilidade das habitações.
No Rio de Janeiro, ao processo de marginalização na ocupação do solo soma-se a ausência do Estado, a não-existência de um planejamento urbano que aponte para a superação das desigualdades, para a urbanização das áreas carentes (onde haja condições técnicas), para a distribuição igualitária da oferta de serviços sociais e urbanos, de uma política habitacional para viabilizar a moradia para todos. Ao contrário, é a especulação imobiliária – cada vez maior – que dá o tom (e que tende a aumentar com as realizações da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016).
Quando se critica a “falta de educação” dessas populações ao acumular lixo em encostas, a burguesia e a mídia escondem o grau de sucateamento da educação pública, a não existência de planos de contingência e de ações e campanhas de prevenção (como na contenção de encostas, na construção de galerias pluviais e sua manutenção) – que demandam a participação organizada da sociedade – e de uma política efetiva de compensação pelos danos de possíveis intempéries.
Os governos burgueses de Sérgio Cabral e Eduardo Paes, com apoio de Lula – incompetentes no trato da coisa pública e omissos no atendimento às necessidades das camadas populares, mas eficazes na aplicação de medidas privatizantes e no desrespeito aos direitos sociais – anunciam a remoção imediata de favelas como solução para o problema, utilizando-se, uma vez mais, de expedientes repressores: no lugar de uma política séria de urbanização das favelas e de ocupação do solo, com a construção de moradias dignas, opta-se pelo uso da força - no estilo "caveirão" de ser - para remover as pessoas para abrigos, sem a garantia de uma nova moradia, em área segura, provida de toda a infraestrutura necessária.
É preciso lembrar o exemplo de Cuba, que muito tem a nos ensinar nesse momento: devido aos valores socialistas, a população da ilha caribenha tem vencido inúmeros furacões nos últimos anos, com número reduzido de vítimas, ao contrário de Nova Orleans, nos EUA, há poucos anos, e ainda muito mais, no Haiti, no mês passado.
É urgente lutarmos por uma nova política de ocupação do solo urbano e um plano urgente de construção de habitações populares em condições dignas de moradia, acesso a eletricidade, serviços de abastecimento e transportes decentes. É importante que os valores do altruísmo e da solidariedade, demonstrados pela população fluminense nos últimos dias, sejam cada vez mais presentes entre nós. Mas não nos basta prestar solidariedade depois de cada desastre como este, que fundamentalmente só atinge os despossuídos, obrigados a viver em áreas de risco. A luta principal é por uma sociedade justa e igualitária.
Abril de 2010
PCB – Partido Comunista Brasileiro
Comissão Política Nacional
Comissão Política Regional - Rio de Janeiro
Enchentes no Rio de Janeiro: que não se responsabilize a pobreza! (Nota Política do PCB)
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Oleh
Rubens Ragone