Miguel Urbano Rodrigues
Os governos do capital de Washington a
Berlim, alarmados com a crise pantanosa em que estão atolados,
apresentam da Grécia a imagem de uma sucursal do inferno. Mas pelo mundo
afora milhões de oprimidos acompanham com admiração e respeito o
combate dos trabalhadores revolucionários do país que foi berço de uma
civilização que marcou indelevelmente o rumo da humanidade.
O agravamento da crise nos países do Sul da zona euro intensificou o debate ideológico na Europa.
Os governantes, os banqueiros, os
dirigentes das transnacionais e os media ditos de referência repetem
monocordicamente que não há alternativa para o capitalismo. Mas é
indisfarçável o seu mal-estar perante o avolumar da contestação ao
sistema.
Os responsáveis pela recessão e pelo
desemprego de dezenas de milhões de trabalhadores constatam que as
guerras de agressão imperiais e o saque dos recursos naturais dos povos
do Terceiro Mundo não trazem solução à crise estrutural do capitalismo.
Enquanto prosseguem politicas impostas
pelo capital que descarregam o custo da crise sobre as suas vítimas,
desenvolvem um grande esforço para evitar que os protestos contra o
sistema de opressão atinjam um nível que ameace a sua continuidade.
Nesse contexto, as campanhas para promover a alienação das massas são
especialmente perversas. O objectivo é impedir que os trabalhadores
tomem consciência do funcionamento da engrenagem da falsa democracia
representativa (que na realidade é uma ditadura de classe) e se
mobilizem para um combate permanente e frontal contra o sistema.
A tese bolorenta segundo a qual através
de lentas reformas aprovadas pelos Parlamentos o capitalismo pode
evoluir, humanizando-se, é retomada em toda a Europa pelas classes
dominantes. Os governantes repetem que a via eleitoral, a única
democrática, aponta o rumo certo para que as reivindicações dos
oprimidos se concretizem numa atmosfera de paz social. Tudo se
resolveria afinal num diálogo sereno entre o capital e o trabalho, entre
os chamados parceiros sociais e o patronato.
Um discurso complementar desse é o dos
intelectuais que, afirmando ser anti-imperialistas e anti-neoliberais,
proclamam que a saída da crise depende da acção dos movimentos sociais.
Mas excluem todas as formas de violência na luta que deveria visar
reformas graduais.
A criminalização do socialismo e dos
partidos operários marxistas-leninistas é uma constante na teorização
desses senhores. Nessas campanhas desempenham um papel fundamental os
social-democratas.
Não é de estranhar que as forças da
direita e os partidos social-democratas tenham recebido com mal
disfarçada simpatia a formação do chamado Partido da Esquerda Europeia
ao qual aderiram muitos partidos comunistas do velho Continente (o grego
e o português foram excepções). Tão benévola atitude é compreensível
porque essas organizações se opõem à radicalização da luta de massas,
defendendo elas também estratégias reformistas que na prática anestesiam
a combatividade dos trabalhadores, neutralizando-os como força de
choque.
LIÇÕES DA HISTÓRIA
A comunicação apresentada no Rio pelo
representante do Partido Comunista da Grécia, no Seminário promovido
pelo Partido Comunista Brasileiro para comemorar o 140º aniversário da
Comuna de Paris (v.odiario.info, 18.09.11), é um documento importante
que contribui para a clarificação do debate ideológico inseparável de
grandes lutas contemporâneas.
É oportuno lembrar que a burguesia
francesa não hesitou em se aliar em l871 ao exército prussiano após a
derrota da França, para massacrar na Paris revolucionaria os comunards
comunistas.
Essa aliança contra natura, rica em
ensinamentos para quantos lutam hoje contra o capitalismo, confirmou
então uma realidade enunciada por Marx: o capital não tem pátria.
O comunista grego alertou para uma
evidência: o Estado burguês não pode ser utilizado contra os interesses
da classe dominante. Por outras palavras, as instituições criadas pela
burguesia para lhe servir os objectivos não podem funcionar como
trampolim para o socialismo.
Na América Latina, em regimes
presidencialistas tem sido possível eleger presidentes com programas
anti-neoliberais com pendores socializantes. Mas o resultado desses
processos não permite optimismo. No Chile «a via pacifica para o
socialismo» terminou num golpe sanguinário. No Brasil, na Argentina e no
Uruguai, Lula, os Kirchner e Tabaré Vasquez arquivaram compromissos
assumidos com o povo e levaram adiante políticas que favoreceram o
grande capital, aprovadas pelo imperialismo. E na Venezuela, na Bolívia e
no Equador, o desfecho das corajosas opções de Hugo Chavez, Evo Morales
e Rafael Correa suscita interrogações sem resposta.
Na União Europeia é ilusória a ideia de
que possa instalar-se no poder qualquer governo empenhado em aplicar um
programa de esquerda ambicioso. A «democracia parlamentar» é, na
prática, uma ditadura da burguesia de fachada democrática.
UM LUAR DE ESPERANÇA
O Partido Comunista da Grécia presta um
serviço aos trabalhadores de todo o mundo ao sublinhar que o Estado
burguês tem de ser totalmente destruído. Reformas cosméticas não alteram
a sua essência de instrumento de opressão dos explorados.
As lutas dos trabalhadores por
reivindicações em múltiplas frentes são não apenas necessárias como
indispensáveis. Vitórias sectoriais abalam o poder da burguesia e
fortalecem a combatividade das massas, mas essas vitórias são ineficazes
se não se inserirem numa estratégia de ruptura com o sistema. No âmbito
de uma ruptura com a política de um governo, mas dentro do sistema, são
por este neutralizadas.
O mesmo se pode dizer da acção dos
Movimentos Sociais. O papel desempenhado por muitos deles foi útil,
contribuiu para o desmascaramento e desprestígio do neoliberalismo. Mas o
imperialismo logo se apercebeu de que o carácter espontandeista da
contestação ao sistema não configurava uma ameaça real. Algumas ONGs são
instrumentos da CIA; uma percentagem ponderável é dirigida por
social-democratas anti-comunistas.A evolução do próprio Fórum Social
Mundial -alias rapidamente infiltrado por políticos a serviço do capital
(até Mário Soares!) - demonstrou precisamente isso. Em breve,
controlado por social-democratas, passou a defender a impossível
humanização do capitalismo.
A mensagem transmitida ao mundo pelo
Partido Comunista da Grécia no Rio de Janeiro vale por um convite à
reflexão sobre o papel decisivo e insubstituível do partido
revolucionário marxista-leninista nas grandes lutas sociais do nosso
tempo.
O seu representante nos lembrou que na
Grécia houve mais de 20 greves gerais desde 2010 e muitas sectoriais. A
mobilização maciça dos trabalhadores foi possível devido ao elevado
nível da consciência de classe e de consciência política de uma parcela
importantíssima do povo grego. Uma frente muito ampla de organizações e
forças progressistas - o PAME – uniu partidos, sindicatos, federações e
comités de orientação classista em torno de objectivos consensuais.
A luta permanente das massas travada em
condições dificílimas sob uma repressão violenta não visou uma ruptura
imediata orientada para a tomada do poder a curto prazo.
O Partido Comunista- o KKE – sabe que
tal meta é inatingível na actual conjuntura. A reafirmação da exigência
da destruição do Estado burguês não significa que esse objectivo tenha
data no calendário.
Numa atmosfera de tensão diária, de
denúncia da política de vassalagem perante as imposições da União
Europeia e do imperialismo estadounidense, o KKE, sem medo das palavras,
defende há anos um programa revolucionário. Sustenta com firmeza que a
socialização dos meios de produção básicos é na Grécia uma exigência da
Historia, assim como a da banca e a das telecomunicações e transportes.
Exige a gratuidade total da saúde, da educação e da previdência. E,
agora, defende a saída da União Europeia, da NATO e do euro.
Reivindicações essas inaceitáveis para o
Estado burguês. Mas justas, traduzindo aspirações profundas de um povo
que não esquece a repressão selvagem do exercito britânico, em
1945,quando, no final da guerra, expulsos o nazis alemães, os
trabalhadores estavam prestes a conquistar o poder para construir uma
sociedade progressista e livre.
Foi essa tenacidade e lucidez na luta do
KKE que viabilizou o surgimento do PAME, como organização frentista de
perfil revolucionário.
Enquanto de Washington a Berlim os
governos do capital, alarmados com a crise pantanosa em que estão
atolados, apresentam da Grécia a imagem de uma sucursal do inferno,
mundo afora milhões de oprimidos acompanham com admiração e respeito o
combate dos trabalhadores revolucionários do pais que foi berço de uma
civilização que marcou indelevelmente o rumo da humanidade.
A arrogância e o poder do imperialismo
desencorajam hoje, é um facto, milhões de pessoas. Mas a maioria das
grandes revoluções antigas e contemporâneas irrompeu contra a lógica
aparente da História. Os povos, quando destruíram uma ordem social que
para eles se havia tornado não somente ilegítima como insuportável, nem
sempre pensaram no futuro imediato.
Acumulada, a opressão, ao ultrapassar
determinado limite, gera nas vítimas uma quase indiferença perante a
morte. E chega um momento em que o desespero, ao generalizar-se, em
efeito epidémico, disponibiliza as massas para lutas que conduzem a
rupturas revolucionárias. Isso aconteceu com o Revolução Francesa de
1789,com as Revoluções Russas de Fevereiro e Outubro de 1917, e na
segunda metade do século passado no Vietnam, em Cuba, na Argélia.
Em Portugal era imprevisível que o golpe
militar do 25 de Abril fosse o prólogo de uma revolução que iria abalar
o Mundo, a mais profunda na Europa Ocidental pelas suas conquistas
desde a Comuna de Paris.
Manter a esperança firme não é uma
atitude romântica; é um dever comunista. O representante do KKE admitiu
no Brasil que «o século XXI será marcado por uma nova onda de revoluções
socialistas.»
Faço minha a sua convicção.
Vila Nova de Gaia, 20 de Setembro de 2011
O Povo da Grécia luta pela construção do futuro
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Oleh
Rubens Ragone